Quando praticar ginástica rítmica é sinónimo de grande felicidade 

Texto: Hélio Nascimento | Fotos: Eduardo Jacinto, in Portimão Jornal nº50


Katia Mileva e Zélia Ramos são duas pessoas felizes, que adoram o que fazem e estão sempre prontas a consolidar um trabalho de anos e anos, inteiramente dedicado à ginástica rítmica. Às vezes com mais dificuldades, outras vezes de sorriso rasgado, têm, todavia, o maior dos prazeres e uma vontade indómita de prosseguir, cativando mais atletas, formando campeãs e tornando a Associação de Ginástica Rítmica de Portimão (AGRP), a cada dia que passa, uma referência incontornável do desporto, sobretudo do algarvio.

Fundada em 2013, a coletividade surge na sequência do trabalho de Katia Mileva, a búlgara que veio para Portugal em 1993, para o cargo de selecionadora nacional, e chegou a Portimão em 2001.

“Estive muitos anos a trabalhar com a Câmara, até que surgiu a hipótese de criarmos a AGRP. Os propósitos têm sido os mesmos: mais trabalho, muitas meninas e o prazer de ver algumas subir ao pódio”, conta a professora, que, na companhia da presidente Zélia Ramos, recebe o Portimão Jornal antes de mais um treino no Pavilhão da Boavista, o local que agora acolhe todas as sessões de preparação.

O clube tem 70 ginastas, com idades compreendidas entre os 3 e os 17 anos, distribuídas por quatro classes, dos 3 aos 5 anos, dos 5 aos 7, mais de 8 anos e o grupo de competição, que engloba 17 atletas, algumas das quais de tenra idade, cuja evolução depende igualmente, claro, da capacidade de cada uma. Os treinos decorrem no Pavilhão da Boavista, a partir das 17h00 – o horário vai oscilando consoante a disponibilidade das ginastas – e até por volta das 20h00.

Da PSP aos Bombeiros e por aí fora…
Nos primeiros tempos da AGRP, os treinos decorriam nas instalações da Polícia de Segurança Pública (PSP) da cidade. Passaram depois para a sala dos Bombeiros Voluntários, a seguir para o Pavilhão Gimnodesportivo e agora estão ‘sediados’ no Pavilhão da Boavista.

“Treinamos numa sala, com uma alcatifa, uma sala que não tem muita altura, o que dificulta o lançamento dos aparelhos. Aqui, a nave é destinada, sobretudo, ao futsal, andebol e basquetebol. Precisávamos de um espaço maior, mais alto, mas, para já, é o que temos”, assinalam as mentoras da coletividade, de certo modo resignadas, mas com sonhos permanentes.

Em Portugal, a história de Katia data de 1993, quando foi convidada pela federação para o cargo de selecionadora nacional. Em 1995, passou a responsável por toda a ginástica na região norte do país, onde realizou obra, com presenças constantes em Europeus e Mundiais, através de excelentes ginastas, que foram deixando a sua marca.

Em 2001, vem para Portimão, a convite da Câmara Municipal, para dinamizar a modalidade na cidade. No Grupo Desportivo da EMARP, onde começou, voltou a obter belos resultados, “com muita competição e uma estrutura forte”, que integrava, por exemplo, professora de ballet, de educação física e outras valências.
“Agora, sou só eu. Trabalho com todas, tentando explorar os pontos fortes de cada uma, e, ao fim de um ano (a pandemia causou alguns embaraços…), já as conheço bem melhor, sei todos os seus nomes e tenho imenso carinho. É uma estreia com classes de formação, mas estou bem integrada e o prazer é total”, vinca Katia Mileva, que sempre trabalhou, preferencialmente, com a competição.


Mais altura e mais espaço 
Zélia Ramos, que, curiosamente, nasceu na África do Sul, sempre teve “uma paixão pelo ballet e pela dança”, atividades que intensificou quando, ainda muito menina, chegou a Portimão. É sócia fundadora da AGRP, foi convidada depois para integrar a Direção, e, desde o ano passado, assumiu a presidência do clube. “Há muito trabalho para gerir, das inscrições aos seguros, do plano de atividades ao acompanhamento das ginastas”, mas quem corre por gosto nunca se cansa. A sua filha também faz ballet e ginástica.

foto: D.R.

A Direção integra mais elementos, igualmente dedicados, mas Zélia e Katia são as almas do projeto. Recebem apoio da Câmara Municipal, através dos contratos-programa, para além de terem patrocínios de empresas privadas, “a quem muito agradecemos”.

O clube tem 94 sócios efetivos (atletas, pais e ex-atletas), que pagam quotas, mas a ajuda do município, também na cedência de transporte quando as provas se realizam fora do concelho, é essencial.

As maiores dificuldades prendem-se, como já deu para perceber, com as instalações, nomeadamente a altura da sala onde decorrem os treinos, porque, como é sabido, na rítmica há aparelhos que têm de ‘voar’ bem alto.

“Para melhorar o nível, mesmo na formação, a altura do espaço é fundamental. E a área também. Não podemos trabalhar com mais de 20 atletas de cada vez na mesma sala. E temos só uma alcatifa. Se pudéssemos treinar mais na nave… era o ideal”.

Competição é só em Portimão  
As responsáveis pela coletividade destacam os muitos e novos pedidos de mais meninas dispostas a experimentar a rítmica, enfatizando o interesse crescente em redor da modalidade, mas, lá está, o espaço não abunda.

“A pandemia também atrapalhou, mas agora, felizmente, está tudo mais calmo. Só que, para gerir uma classe com o mínimo de qualidade, não é possível termos mais de 20 ginastas em cada sessão”, repete Katia. E acresce que esta disciplina é deveras exigente, obrigando ao contínuo repetir de todos os exercícios.

Mesmo assim, reconhece, o panorama no Algarve não é animador. “Antes de eu chegar havia alguns torneios, mas nada de competição. No concelho temos mais um clube, na Mexilhoeira, de resto, em toda a província, as coletividades têm somente classes de apresentação. Competição é só aqui, em Portimão”, salienta, referindo-se depois ao desenvolvimento que a acrobática e os trampolins vêm registando, mercê, em especial, das condições que usufruem.

“Se nós, por exemplo, pudéssemos treinar no Portimão Arena, a evolução seria bem diferente. Daríamos um enorme salto qualitativo. Veja-se a crescente exigência dos ciclos olímpicos, nomeadamente na altura mínima dos lançamentos”, sublinha a professora, de 59 anos, numa opinião corroborada por Zélia, de 39 anos.

As duas, em conjunto, não só comungam os mesmos pontos de vista sobre a ginástica rítmica portimonense como, em relação aos obstáculos que todos encontramos no dia a dia, revelam o que é essencial: a vontade de os superar.

Forte dinâmica na formação
Questionadas sobre os próximos passos e os objetivos a curto e médio prazo da AGRP, as duas mentoras ficam com um brilho nos olhos. “No próximo ano conto ter uma pessoa a ajudar-me. Trabalhar sozinha a este nível é bastante difícil. Dispor de outra treinadora é um sonho e um contributo fundamental para o clube evoluir”, garante a búlgara.

Por sua vez, Zélia Ramos enfatiza a “riqueza humana de trabalhar em equipa para alcançar melhores resultados”.

Uma coletividade que aspire a ‘dar cartas’ na formação e, ao mesmo tempo, na competição tem, obrigatoriamente, de possuir uma estrutura que comporte mais técnicos, ou seja, um staff capaz de dar resposta a todos os sonhos. “Aqui, fazemos tudo as duas”, comentam, mas sem sinais de quebra ou desconforto perante a situação. 

A derradeira chamada de atenção vai para a “grande dinâmica” das classes de formação, que têm exibições de encher o olho e marcam presença em vários saraus. “Tivemos o Sarau de Natal, o da Primavera e agora o evento da Associação de Ginástica do Algarve, o ‘Encontro para Grupos’. Vamos, entretanto, organizar o nosso Sarau de Encerramento da época, no próximo dia 25, aqui, no Pavilhão da Boavista, com todas as classes em ação”.

Será mais um aliciante para as meninas da AGRP, que, no entanto, “estão sempre motivadas e contentes”. E é isso, repita-se, que faz de Katia e Zélia duas mulheres felizes. “Se elas estão bem e satisfeitas, nós também ficamos a transbordar felicidade”. Um amor transversal que une quem ensina e quem pratica a modalidade. E que é bonito de ver. 

AGRP fez seis atuações no Portimão Arena

A AGRP efetuou quatro exibições no Torneio Internacional de Portimão e mais duas na Taça do Mundo, numa “semana intensa, mas muito gratificante”, em que a graciosidade, a arte e a disciplina das jovens atletas da professora Katia Mileva cativaram a assistência. Durante alguns minutos, em cada uma dessas atuações, o imponente palco do Portimão Arena tornou-se o ambiente de sonho para as pequenas ginastas. Algumas delas, note-se, tiveram de faltar às aulas, mas deixaram a promessa de recuperar rapidamente a matéria escolar.

Sobre a Taça do Mundo, que reuniu a elite da disciplina (187 atletas no total, representando 25 países), a alemã Darja Varfolomeev esteve em particular destaque, ao vencer em bola e maças, enquanto Adi Katz (Israel) e Eva Brezalieva (Bulgária) triunfaram em arcos e fitas, respetivamente. Nos conjuntos, vitórias do México (3 fitas e 2 bolas) e de Israel (5 arcos), com Portugal a obter o 7º lugar nesta final, através de Beatriz Freitas, Bruna Simões, Clara Melo, Felícia Oprea e Margarida Ferreira.

Nomes que são referência ao longo dos anos 

Katia Mileva orgulha-se de ter levado muitas ginastas a lugares de relevo no panorama da ginástica rítmica portuguesa. Procurando não se esquecer de nenhuma, fala de Dalia Porokhonya, vice-campeã em 2016, que, entretanto, já saiu do clube, de Laura Abel, que depois de uma dúzia de anos na modalidade formou-se na Escola Superior de Dança, e de Mariana Jacinto, que durante um largo período esteve ao mais alto nível, tendo sido campeã nacional em arco e representado a seleção.

“Um bocado da nossa história passa por estas memórias e por estes bons resultados, desde o tempo em que estive no Grupo Desportivo da EMARP”, explica a professora búlgara, aludindo ainda às três medalhadas na prova de iniciados, em 2019, sempre a nível de I Divisão. Mais recentemente, Maria Bragança, de 9 anos, obteve o terceiro lugar no Nacional do segundo escalão. É uma das fortes apostas da AGRP, com a curiosidade de a pequenita, extramente graciosa nos seus exercícios, ser filha de pai italiano e mãe ucraniana.

“Temos ainda a ‘ginástica para todos’, que é um concurso em que se distingue o trabalho de grupo, diferente do da formação, no qual alcançámos o bronze e uma menção honrosa”.

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