A incrível história do holandês que se tornou ‘rei dos caracóis’

Texto: Hélio Nascimento | Foto: Portimão Jornal


Willem Hendrik é o holandês mais conhecido de Portimão, muito à custa dos caracóis, o negócio em que apostou há muitos anos e sobre os quais tem histórias bem curiosas para contar. Aliás, quando chegou à cidade e se instalou na Praia do Vau, a fazer campismo, no ano de 1987, Willem estava longe de pensar que a sua vida ia levar tantas voltas.

Quem não conhece, de facto, ‘O Holandês dos Caracóis’? Instalado na Rua Engenheiro Duarte Pacheco, uma paralela à Rua Dom Carlos I, o restaurante serve também comida típica algarvia, mas é o popular molusco que dita leis e serve de referência. O local foi inaugurado em 2009, mas muito antes disso, em 1996, já Willem e a esposa Suzele davam cartas nesta iguaria.

Ambos recebem o Portimão Jornal à porta de sua casa, para uma conversa informal e deliciosa… tanto quanto os caracóis que dali saem em travessas e pratos e sem mãos a medir. 

“Estou em Portimão há cerca de 35 anos. Vivia no Vau, mas, como sou um apaixonado pela pesca e porque falo muitas línguas, cedo comecei a ser convidado para andar nos barcos de turismo, ir às grutas e dar uma ajuda a quem precisasse”, conta Willem, secundado por Suzele, que não deixa nada ao acaso quando se trata de historiar acontecimentos e enumerar episódios. “Nessa altura não havia muitos barcos de turismo e apenas os mais pequenos iam às grutas”, justifica a portimonense de gema, pronta a narrar a epopeia dos caracóis.

Tudo começou no snack-bar ‘Valentino’, nas traseiras do Museu, um sítio muito frequentado e, então, único na zona. Willem e a mulher tomaram conta do negócio e os caracóis cedo se tornaram reis e senhores dos fins de tarde e noites amenas, com uma clientela ávida de acompanhar o petisco com pão torrado e a inevitável cerveja.

Primeira experiência “foi uma desgraça”
“Quando fiz caracóis pela primeira vez a coisa não funcionou”, assume Willem, algo embaraçado antes de soltar uma gargalhada. Suzele acena com a cabeça e também se ri. Era ela a habitual cozinheira, mas, num período em que teve de se ausentar, o holandês quis surpreender uns amigos clientes e ser ele próprio a confecionar o lanche.

“Foi uma desgraça. Lavei os caracóis e depois meti-os no micro-ondas! Parecia pipocas, o que eles se riram!”, recorda. A pressa de querer servir e impressionar não surtiu mesmo efeito. O certo é que Willem não tardou a aprender a fazer o molusco e hoje todos lhe reconhecem atributos e mérito.

O casal deixou o ‘Valentino’ e acabou por inaugurar a atual casa, em 2009, que se chama mesmo ‘O Holandês dos Caracóis’, com mais espaço, melhores condições e uma cozinha funcional que Willem fez questão de mostrar. “Fizemos as obras ao nosso gosto, aproveitando os três andares, incluindo o último, que chegou a ser um galinheiro”, explica Suzele, sempre objetiva e com uma memória fantástica. “Este sítio funcionava como carvoaria, mercearia e taberna. Até havia uma pedra e uma argola lá fora para atar os burros, quando as pessoas iam às compras”.

Agora, todavia, o cartão de visita chama-se caracol. Há mais petiscos e pratos típicos, que vão das favas com peixe frito ao polvo, lulas cheias, carapaus alimados e sardinhas albardadas. O restaurante também serve almoços e, até outubro, vai ter certamente muita afluência, a exemplo dos anos anteriores.
Willem e Suzele têm três empregados, número que duplica quando chega o verão. Um dos ‘fixos’, que está ‘de serviço’ desde o princípio da aventura, chama-se Joana e é filha de Suzele, mas não gosta que se saiba para não a apelidarem de ‘patroa’. Começou a trabalhar novinha, nas férias, para arranjar dinheiro e comprar uma ‘scooter’.

Nos melhores dias saem 200 litros
A procura de caracóis é enorme e nos melhores dias, quando o calor e as férias convidam à degustação, sempre acompanhada por uma ‘imperial’ fresca e bem tirada, chegam a ser confecionados 200 litros do apetitoso molusco. A caracoleta tem igualmente muita saída, seja cozida, guisada ou na grelha. Willem, que no início nem gostava de “comer os bichos”, é agora um apreciador nato. “Como quase todos os dias e gosto muito de caracoletas mouras grelhadas. É lavá-las bem, deitar um pouco de sal e colocá-las na chapa. Enquanto assam faz-se o molho de manteiga, com limão, alho e piripiri, deitamos uma colher do molho por cima da caracoleta e é um espetáculo”.

O caracol vem todo de Marrocos e passa por um processo de inspeção, sendo alvo de testes. “Se o produto não estiver em condições, pode ficar retido em Espanha”, salienta Suzele, explicando que “o problema do caracol algarvio é que as nossas árvores levam pesticida, ao passo que o marroquino sobe às montanhas e beneficia da humidade”.

Willem exibe então enormes sacos de caracóis e aponta para algumas caraterísticas que são um “certificado de saúde” do petisco. Ao lado, está a sua inseparável bicicleta, com a qual se desloca pela cidade. “Famoso? Não sei porquê. Comecei quando havia menos movimento e pouco caracol, e, agora, toda a gente me conhece, talvez porque nem todos metem os caracóis no micro-ondas”, graceja, sempre com boa disposição.

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