Lúcia Ribeiro espalha talento ‘entre duas terras’

Texto e foto: José Garrancho


Lúcia Ribeiro diz ser “uma algarvia marafada”, nascida em Portimão, de onde saiu com 20 primaveras, à descoberta de outras realidades. “Com o 25 de Abril, as pessoas puderam começar a sair de Portugal e algumas foram estudar para o estrangeiro. Fui como ‘au-pair’, com um contrato de um ano, para aprender a língua. E também por aventura. Sou uma aventureira e, por isso, é que passo a vida a viajar, pintando nos mais diversos locais”, começa por contar a artista.

Encontrou o “amor” e foi para Itália, onde viveu alguns anos e foi mãe por três vezes. Mais tarde, regressou à Suíça, onde fixou residência. Nos últimos anos, reformada, faz a sua vida entre Portimão e aquele país.

Entre confidências acerca do seu percurso, afirma que a arte e a beleza sempre estiveram dentro de si, porque é do signo Peixes e ama a natureza. “Tudo o que é belo fascina-me, embora a beleza seja relativa. Por isso, profissionalmente, abri o meu instituto de beleza, onde laborei durante cerca de 20 anos, dando também formação nesse mesmo ramo”, justifica.

E é quase por um acaso do destino que a pintura surge na sua vida. “Um dia, fui fazer um workshop. Apenas meio-dia. Pintei o mar e nunca mais deixei esta arte”, resume.

No entanto, o verdadeiro botão de arranque foi uma visita ao museu Langmatt, em Baden, na Suíça, que possui quadros de impressionistas. “Fiquei presa ao estilo e nunca mais parei. Mas pinto à minha maneira. Não tenho a tendência de seguir ninguém. Coloco na tela o que sinto, no momento”.

Ao vivo ou através de fotos
“Gosto de ir ao local e pintar na natureza. Naquele momento em que sinto as emoções, começo um quadro. Naturalmente, é difícil fazer uma pintura completa num local, até porque as luzes mudam, ou está muito vento, ou muito calor, muita ou pouca luz. Regresso muitas vezes ao mesmo sítio”, conta a artista, que utiliza a pintura a óleo ou com giz pastel para criar as suas obras, embora prefira esta última técnica. E explica ao Portimão Jornal o porquê da sua preferência.

“Quando pinto ao ar livre, no exterior, prefiro o giz pastel, porque é mais fácil. Levamos a caixinha com os paus de giz de diferentes cores e já está. Além disso, não necessitamos de fazer um esboço. Vamos desenhando, à medida que vamos pintando. Pintamos muito com os dedos e eu gosto muito do toque, até porque também faço cerâmica”, argumenta, ainda que admita que nos últimos tempos se dedica mais ao óleo.

Não vê a vertente comercial como uma prioridade, pois esta é uma paixão. Juntou-se a um grupo que foi pintar para as Fontes de Estômbar e escolheu o giz, porque, nem quando pinta, nem quando expõe, coloca a questão do lucro. “Apenas a parte artística conta. Nunca penso na venda, mas apenas em mostrar o meu trabalho e que as pessoas fiquem em sintonia com o que senti, quando fiz o quadro”, conta.

Anjos surgem sem serem chamados
Ao olhar com atenção para os quadros, algumas pessoas conseguem vislumbrar anjos meio escondidos nas paisagens. “Saem-me dos dedos, naturalmente. Por vezes, fico surpreendida, quando os descubro. Depois, dou-lhes um pouco mais de realce”, afirma, acrescentando que é possível que nem sempre o público se aperceba destas imagens.

“Se o fazem, não dizem. Mas penso que a maioria não os distingue. E é muito interessante, porque cada um tem uma perceção diferente. Há sempre interpretações diversas”, diz.

Embora não sejam abstratos, os quadros de Lúcia Ribeiro também não são demasiado realistas. Há um pouco de desfoque presente. Isto porque, conforme esclarece a artista, não lhe agrada a “pintura demasiado nítida”, porque recorda as “fotografias”. “Se, por acaso, a semelhança é demasiada, transformo o quadro, para que ela desapareça”, assegura.

Utiliza, porém, a fotografia para registar uma determinada paisagem, pois uma pintura demora tempo a elaborar e a luz vai mudando, ao longo do dia e dos dias, com diferentes tonalidades, intensidade e temperatura.

Assim, “faço uma foto, antes de começar a pintar. Esse é o segredo, embora não tenhamos de reproduzir exatamente o que vimos. Eu só pinto o que sinto”, exclama.

Artista quer apostar na cerâmica

“A cerâmica é um dos meus ‘hobbies’, mas apenas há poucos anos, embora sempre tenha sentido vontade trabalhar com o barro, porque é feito com as mãos. Em 2019, fui pintar com outro artista, na Suíça, e encontrámos uma exposição de cerâmica. A ceramista estava a explicar como se fazia e eu pedi para experimentar. Ela disse que ia almoçar, mas que eu podia regressar durante a tarde. E foi assim que comecei”, recorda. No entanto, Lúcia Ribeiro ainda não faz cerâmica em Portugal, porque não conseguiu arranjar o espaço ideal para moldar e, mais importante, para colocar um forno, elemento indispensável para esta arte. “Quero ter tudo bem organizado, antes de iniciar a atividade. Mas, quando estou na Suíça, faço algumas peças bonitas”, conclui Lúcia Ribeiro.

BREVES

Uma coleção de impressionismo
O museu Langmatt, em Baden, Suíça, é considerado único. A moradia estilo ‘arte nova’ do casal Sidney e Jenny Brown-Sulzer possui a mais importante coleção privada do impressionismo, na Europa. Ali, os visitantes podem admirar obras de Renoir, Cézanne, Monet, Van Gogh e outros tantos artistas. Há pouco tempo, o museu passou a ter em exposição uma coleção de arte contemporânea e está aberta à declamação de poesia, concertos e mostras de carros antigos.

“A luz do Algarve fascina-me”
“Enamorei-me pelas ilhas da Ria Formosa exatamente por causa da luz que lá encontrei, principalmente na do Farol, que possui uma luminosidade única. Nunca vi luz assim em qualquer outro local. O pôr do sol é único. Acabei por ficar para ver o nascer do sol, mas depois não consegui vir embora. Aliás, o pôr do sol no Algarve é único, principalmente no inverno, com o sol entre as nuvens, obtendo tonalidades maravilhosas, que transmite também ao mar”.

Exposições já realizadas

⇨ 2009 e 2010 | Galeria Comunitária de Exposições de Arte de Spreitenbach, na Suíça

⇨ 2013 e 2014 | Biblioteca Municipal de Dietikon, na Suíça

⇨ 2018 | Escola de Arte Habi-Art, em Zurique, na Suíça

⇨ 2023 | Ilha da Armona, no Algarve, em Portugal

⇨ 2023 | Palácio Albrizzi Capello, em Veneza, na Itália

⇨ 2024 | EMARP, em Portimão, em Portugal

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