Algarvios brilham no desporto

Texto: Rafael Duarte


Seria preciso um livro para destacar todos, desde atletas como João Vieira, reconhecido na marcha, José Costa, que ficou em 7º nos Jogos Olímpicos na vela 49er fazendo dupla com Jorge Lima, Filipe Santos, vice-campeão no Europeu de Natação DSISO nos 50 metros livres, a treinadores como José Sousa Uva, que guiou Patrícia Mamona para as grandes vitórias nos últimos anos, Luís Modesto, que colocou o Imortal Basket entre os grandes da modalidade, Pedro Moreira, que reergueu a equipa de futsal do Portimonense, ou Mário Lemos, atualmente no Bangladesh e chegou a assumir a seleção principal daquele país.

São inúmeros os grandes exemplos de sucesso e a Algarve Vivo falou com algumas destas personalidades que nos contaram como tudo começou e como chegaram ao mais alto patamar.

Ana Cabecinha | A marchadora

É a vida de uma campeã. Ana Cabecinha deu-nos esta entrevista depois de se sagrar pela nona vez e pelo quarto ano consecutivo campeã nacional de 20 quilómetros marcha, e ainda para mais a marchar em casa, pois a prova foi em Olhão. Aos feitos nacionais, a atleta junta as quatro vezes que foi aos Jogos Olímpicos, onde o melhor resultado foi o 6º lugar em 2016, o 4º lugar no Mundial de Pequim em 2015, e a medalha de bronze no europeu de juniores em 2003, que Ana Cabecinha aponta como “o momento em que caiu a ficha porque antes era só mais uma atleta e aquela medalha veio na altura certa”.

Tornou-se numa das maiores referências em Portugal na marcha e tudo começou com um acidente. “Caí de uma ponte quando era criança. Parti a perna e o tratamento era fazer exercício físico. Como o meu cunhado era treinador do Clube Oriental de Pechão falou comigo e entrei no clube”. Nasceu no Alentejo, mas respira o Algarve. “Foi o Algarve que me formou como atleta e como mulher. Tudo o que sou hoje é graças ao Algarve”. E a região responde com o massivo apoio. “É muito especial esta ligação. Nos outros anos quando consegui grandes resultados já esperava uma multidão à minha espera, mas nos últimos Jogos Olímpicos as coisas não correram tão bem e mesmo assim o pavilhão estava cheio para me receber”.

Diogo Marreiros | Sobre rodas

Diogo Marreiros tinha quatro anos quando calçou os primeiros patins. “A patinagem é uma modalidade com muita tradição em Lagos com o hóquei em patins e a formação do Roller Lagos. Como o local dos treinos era perto do trabalho da minha mãe comecei por ver alguns treinos, mas depois de ter experimentado ficou mesmo a paixão”, recorda-nos o atleta algarvio.

Hoje Diogo Marreiros já ultrapassou as 120 medalhas de ouro a nível nacional e alcançou grandes resultados a nível Europeu e Mundial. Um desses grandes feitos aconteceu no ano passado quando se sagrou campeão europeu nos 10 mil metros da patinagem de velocidade e deu a Portugal a primeira medalha de ouro de sempre em seniores na modalidade.

“Foi muito especial porque era um objetivo que já perseguia há bastante tempo. Em 2017, quando o Europeu foi em Lagos, e depois quando consegui duas medalhas de prata, mas sempre muito perto do ouro. Andava um bocado frustrado, mas finalmente consegui e ainda para mais no ano em que o campeonato se realizou em Portugal e apesar da pandemia tinha a minha família presente”.

O próximo passo já está definido. “As datas das provas ainda são incertas devido à pandemia, mas o que me falta é o título mundial e esse deve ser o principal objetivo. Vamos apontar para isso!”.

Joana Schenker | Ícone do bodyboard

São cerca de 20 anos de competição e que fazem de Joana Schenker a grande referência portuguesa no bodyboard. O currículo não engana: sete vezes campeã nacional, quatro vezes campeã da Europa e campeã do Mundo em 2017. O ano passado foi o mais difícil neste percurso onde a pandemia obrigou a algarvia a ficar 56 dias longe do mar e quase um ano sem competição.

“Nunca uma lesão me obrigou a ficar tanto tempo longe da praia e a maior dificuldade para mim foi mesmo não poder surfar. Ainda assim acabou por ser uma aprendizagem porque experimentei muitas coisas diferentes e aproveitei para treinar em casa. A verdade é que quando voltámos ao mar eu estava em melhor forma física do que quando parei”, lembra a bodyboarder.

Essa espera acabou com o regresso do Circuito Nacional de Bodyboard no final de agosto do ano passado, mas uma lesão dificultou a tarefa da algarvia em revalidar o título pelo oitavo ano consecutivo. “Lesionei-me um dia antes da prova nas costas. Foi um mês e meio de circuito, mas não recuperei a tempo. Acabou por ser o meu pior resultado de sempre”.

Agora sem lesões a atleta de Sagres já prepara o Campeonato Mundial de Bodyboard, que arranca em maio, onde vai uma vez mais representar as cores de Portugal e do Algarve. “Vejo-me como uma embaixadora do Algarve porque é a minha casa e tenho muito orgulho de o fazer”.

Luís Conceição | O selecionador

Um treinador começa normalmente a sua carreira numa fase mais adulta, mas Luís Conceição iniciou o seu trajeto quando ainda estava no secundário. “Comecei a treinar uns miúdos da minha aldeia em Martim Longo. Formámos a equipa de iniciados, onde até ganhámos algumas taças, e mais tarde criámos a equipa sénior”. Foram 12 anos no Inter-Vivos e pelo meio a representar as seleções de futsal da Associação de Futebol do Algarve. Os resultados despertaram o interesse da Federação Portuguesa de Futebol que convidou o técnico algarvio para treinar a Seleção Nacional de futsal feminino.

“Quando cheguei em 2014 só tínhamos as seniores e agora temos quatro seleções de diferentes escalões. Atualmente somos uma das seleções referência a nível europeu e mundial”. Um estatuto que se construiu com a conquista dos Jogos Olímpicos da Juventude de sub-19 e tendo a equipa sido vice-campeã da Europa e do Mundo.

“No momento em que me convidaram foi para fazer crescer o futsal feminino. Criar mais escalões para ajudá-las a crescer e é isso que tem acontecido”. E para quem treinou homens e mulheres, há diferenças? “A mulher tem menos força e é menos explosiva, mas a nível de qualidade e conhecimento do jogo é muito idêntico”. Ao leme de Portugal não esconde o orgulho em ser algarvio e lembra que “temos de nos orgulhar disso porque o Algarve não pode ser só visto como sol e bom tempo”.

Ricardo Melo Gouveia | A referência no golfe

É o único português a competir no agora denominado DP World Tour, mas durante muitos anos conhecido como European Tour. Trata-se do principal circuito de golfe e onde Ricardo Melo Gouveia quer orgulhar, ainda mais, os portugueses.

O algarvio conseguiu esse desejado regresso depois de ter encerrado a temporada do ano passado com dois títulos no Challenge Tour: o Italian Challenge e o Made Esbjerg Challenge, atingindo os cinco troféus na carreira. “Foi um ano muito positivo. O meu objetivo era recuperar o cartão para o DP World Tour. Com a minha segunda vitória mudei os meus objetivos e tentei ficar no primeiro lugar. Quase consegui, mas foi pena porque faltou ganhar a última prova. Ainda assim foi uma época importante para mim porque recuperei a confiança que tinha perdido ao longo dos anos”.

Vencedor do Challenge Tour em 2015, Ricardo Melo Gouveia foi o primeiro português a conquistar a segunda liga do golfe e no mesmo ano também se tornou no luso mais bem classificado de sempre no ranking mundial. Uma vida de muitas viagens, mas sem esquecer as raízes. “No Algarve temos o clima, temos as condições perfeitas para a preparação da minha época”. Do Algarve para o Mundo, Ricardo Melo Gouveia mostra-se confiante para 2022.

Ricardo Teodósio e José Teixeira | Prego a fundo

É uma dupla que funciona sobre rodas. Ricardo Teodósio e José Teixeira sagraram-se campeões nacionais de ralis em 2019 e 2021. A última conquista foi festejada euforicamente no Rali de Mortágua, a prova que encerrou o campeonato e confirmou a vitória do albufeirense e do armacenense.

“Foi um dos dias mais difíceis de ralis para nós. Foi um dia muito pesado. Estávamos a lutar pela vitória com o Armindo Araújo, que teve de desistir, mas isso não nos facilitou a vida porque nós tínhamos que continuar a fazer a nossa prova e conseguir ficar em 2º no mínimo. Entretanto tivemos alguns problemas com o carro que me fizeram stressar bastante, mas pusemos o carro em condições na assistência e na parte final conseguimos o grande objetivo”, recorda-nos o piloto Ricardo Teodósio.

Ao longo desta jornada não faltou o apoio dos algarvios. “Tivemos o prazer de ter uma autêntica mancha amarela a apoiar-nos nas corridas. Sempre que conseguia levantar a cabeça durante as provas foi rara a vez que não vi pessoas vestidas com o nosso amarelo florescente que é tão característico”, conta José Teixeira, navegador que guia Ricardo nos troços. Uma dupla de sucesso e esse pode mesmo ser o segredo para as vitórias alcançadas. “É um trabalho de equipa muito bem feito” destaca o piloto que lembra “a equipa que está dentro do carro e quem trata dele”.

Tomás Barroso | O capitão

O Algarve tem bons exemplos no basquetebol. O Imortal Basket está na Primeira Liga da modalidade e os capitães de FC Porto e Benfica nasceram a sul do país. Miguel Queiroz, ao serviço dos dragões, tem seis títulos nacionais e Tomás Barroso, que representa os encarnados, soma 24 troféus. Uma carreira que começou aos 12 anos no CB Albufeira, mas cedo mostrou o seu potencial.

“Com 16 anos saí de casa e fui para Espanha. Voltei para Portugal para representar o Benfica, mas comecei por ser emprestado ao Ginásio Figueirense e depois sim afirmei-me na equipa”, conta o basquetebolista de Albufeira, que acabou por habituar-se desde cedo a adaptações a novas realidades.

“Tinha 20 anos quando integrei o plantel sénior do Benfica. Foi só difícil para mim porque no primeiro ano tive uma lesão no joelho, mas foi fácil perceber o papel que podia ter na equipa com a ajuda que tive de quem estava à minha volta”. 11 anos depois, continua no Benfica e hoje é capitão da equipa principal.

“Tem sido uma experiência fantástica. Sair do Algarve para disputar títulos no melhor clube de Portugal é um motivo de orgulho para mim. O meu sonho era atingir o meu máximo potencial e estar no Benfica é reflexo disso mesmo”, afirma Tomás, que aos 31 anos garante: “Olho para trás e sinto-me orgulhoso, não gosto de dizer satisfeito porque parece que acabamos por aqui, e tenho ambição de continuar a ajudar a equipa”.

Rui Tavares | Com as luvas de guarda-redes nas malas

Nasceu em Olhão e a carreira de jogador passou sempre por Portugal. O cenário mudou quando pendurou as luvas para se tornar treinador de guarda-redes. Nos primeiros anos manteve-se no país, mas em 2014 fez as malas para uma viagem que ainda não teve regresso.

“O António Oliveira convidou-me para um clube do Irão, que era treinado pelo pai dele, o Toni. Quando saí de Portugal queria que as pessoas conhecessem o meu trabalho e foi com essa força que abracei esse projeto. Foram seis anos no Irão muito positivos e sofredores, mas futebolisticamente fui muito feliz”. Depois disso ficou um ano nos Emirados Árabes Unidos e agora está a cumprir a segunda temporada no Equador.

“Não tem sido fácil estar longe de casa. Quando saí de Portugal pensava que ia estar apenas duas épocas fora, mas depois regressava e continuava a fazer o meu caminho por terras lusitanas. Talvez felizmente isso não aconteceu e enquanto as coisas correrem bem vou continuar assim”. E a verdade é que o ano passado foi inesquecível. Estava de férias em Portugal quando aceitou o convite de Renato Paiva para juntar-se ao Independiente del Valle.

No ano de estreia deram ao clube o primeiro campeonato da sua história. “É um marco histórico para a vida do clube e também um motivo de orgulho para as pessoas envolvidas no processo.” E é por terras equatorianas que Rui Tavares quer continuar a conquistar troféus: “Houve uma possibilidade de voltar, mas estou muito feliz por trabalhar com o Renato Paiva e este staff”.

Yolanda Hopkins | Na crista da onda

Vice-campeã nos Jogos Mundiais de surf e 5ª classificada na estreia do surf nos Jogos Olímpicos. 2021 foi o ano de Yolanda Hopkins que também esteve perto de conseguir um lugar no Circuito Mundial.

“Seria a cereja no topo do bolo, mas saí nos quartos-de-final num dia estranho. Ondas minúsculas e várias situações que limitaram a minha prestação”, conta-nos a algarvia, que está a viver na crista da onda com os grandes resultados. “O meu reconhecimento em Portugal mudou. Agora entro na praia e vejo que as pessoas notam a minha presença e os mais novos vêm sempre ter comigo, mas eu adoro isso. Vejo que eles precisam de alguém como inspiração porque no Algarve é difícil fazer vida com o surf”.

Yolanda já foi uma dessas crianças. Há cerca de 17 anos entrou numa escola de surf em Quarteira a convite do professor de Educação Física. “No início deram-me uma prancha de bodyboard porque era muito nova, mas uns 10 minutos depois vi que não era para mim. Fui para onde eles estavam a dar aulas de surf e disse que queria aquelas pranchas. Sem ter prática nenhuma meti-me logo em pé na prancha e ajudaram-me. Ainda hoje lembro-me desse momento porque foi uma sensação incrível”. Agora olha para 2022 com muita confiança e sob o olhar atento dos portugueses: “Pressão? É mais gasolina no meu fogo!”


O Algarve dentro das quatro linhas

Vamos imaginar um torneio entre distritais com jogadores das equipas seniores. Para o Algarve não seria difícil fazer uma equipa de qualidade. Na baliza temos João Virgínia, de Algoz, que deu os primeiros passos no Algarve, mas esteve os últimos anos em Inglaterra, de onde chegou ao Sporting por empréstimo do Everton.

Tem representado Portugal e conquistou o Europeu de sub-17 e sub-19. Na linha defensiva juntamos juventude à experiência. Por um lado, o portimonense Rúben Fernandes, capitão do Gil Vicente, que esteve 16 épocas ao serviço dos alvinegros, e o olhanense Vasco Fernandes, que está no Casa Pia e chegou a representar o clube de Olhão na Primeira Liga.

Por outro lado, há jovens como os olhanenses Ricardo Mangas, do Bordéus, e Leonardo Lelo, do Casa Pia, que prometem estar entre os grandes daqui a uns anos.

No meio-campo o difícil seria escolher: os portimonenses João Moutinho e Pedro Delgado, campeão na China, o farense Diogo Mendes, indiscutível no Marítimo e que esteve 11 anos no Benfica, tantos como Guga Rodrigues, de Vila Real de Santo António, agora a dar nas vistas pelo Rio Ave. Para finalizar o Algarve faz-se representar pelo olhanense Gonçalo Ramos. O avançado fez toda a carreira no Benfica e este ano tem sido uma aposta na equipa principal.

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