António Eusébio: “A água disponível chega para cerca de dois anos”
Onovo responsável pela empresa faz um ponto de situação sobre os recursos existentes, os investimentos em curso e previstos, bem como a importância da gestão eficiente de um bem escasso. A aposta na sensibilização da população tem sido sempre uma preocupação para a Águas do Algarve.
O antigo presidente da Câmara Municipal de São Brás de Alportel e ex-deputado socialista inicia agora um novo ciclo na liderança do Conselho de Administração, onde se impõem questões como a dessalinização, poupança e alterações climáticas. Em entrevista à Algarve Vivo refere que ainda é cedo para falar de aumentos do preço da água e explica a importância da questão hídrica ter sido incluída no Plano de Recuperação e Resiliência apresentado pelo Governo.
Que quantidade de água para abastecimento há no Algarve?
Os volumes de água superficial acumulados nesta data na região algarvia são de 90 hectómetros cúbicos (hm3) na barragem de Odelouca, 72 hm3 na barragem de Odeleite e de 25 hm3 na barragem do Beliche. Poderemos ainda considerar a água existente nas albufeiras da Bravura e do Funcho, além das reservas existentes nos aquíferos da região. Sabendo que o consumo humano anual é de aproximadamente 73 hm3, a água atualmente disponível dá-nos uma garantia aproximada de dois anos.
As alterações climáticas tendem a agravar-se e a seca tem sido uma grande preocupação. Que estratégias estão a ser estudadas e o que deve ser implementado na região?
De facto, as alterações climáticas têm vindo a tornar os períodos de seca mais constantes. Com esta preocupação, a Águas do Algarve, empresa do Grupo Águas de Portugal, tem vindo a trabalhar com a Agência Portuguesa do Ambiente e com o Ministério do Ambiente na definição de novas soluções, que proporcionem condições de maior robustez e resiliência ao Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água do Algarve. No Plano de Eficiência Hídrica estão contemplados vários projetos a serem executados, entre estes a elevação de água do Rio Guadiana para a barragem de Odeleite, a captação do volume de água inacessível (volume morto) da barragem de Odeleite, a dessalinização, o reforço da interligação Barlavento Sotavento e a reutilização de água residual tratada de vários sistemas. Em simultâneo, continuamos a trabalhar na manutenção do sistema e na execução do investimento previsto no contrato de concessão. Até 2022, estão previstas serem executadas obras como a reabilitação da ETAR de Lagos, a construção da nova reserva do Barlavento, o reforço de adução ao interior do concelho de Loulé, a central de secagem solar de lamas da ETAR de Vila Real de Santo António, entre outros investimentos que rondaram os 30 milhões de euros. Todos estes projetos são da maior importância para a região e apesar de, no que respeita a massas de água, neste momento, estarmos numa situação confortável, temos de aproveitar esta oportunidade. Além dos seus residentes, o Algarve é uma região turística por excelência, que precisa destes investimentos para continuar a garantir o padrão de qualidade, a preservação do ambiente e a economia da região.
A inclusão dos recursos hídricos no Plano de Recuperação e Resiliência é um sinal positivo? O que implicará?
Considero que se trata de um bom planeamento e de uma oportunidade. Sem esse financiamento não seria possível concretizar os investimentos agora previstos. Naturalmente, implicará um esforço de todas as entidades envolvidas, bem como da Águas do Algarve, pois será necessário, com as equipas de técnicos que temos hoje, executar quatro a cinco vezes mais investimentos que os que estão previstos no contrato de concessão. É um grande desafio.
Que projetos tem a Águas do Algarve previstos sobretudo a nível da sensibilização e responsabilidade social, área que tem um grande peso na vossa atividade?
Sim, de facto reconhecemos a importância da comunicação, da sensibilização e da educação ambiental, a qual é transversal a toda a nossa atividade na região. Tratam-se de temáticas que tendem a ganhar ainda maior relevância também muito devido às alterações climáticas e aos desafios ambientais que se apresentarão nos próximos anos à humanidade. Estamos focados no desenvolvimento destes processos. Pretendemos continuar a ser uma entidade ativa na consciencialização da sociedade, em particular os mais jovens, para as vulnerabilidades climáticas, promovendo a compreensão de que a adaptação às alterações climáticas requere a mobilização de todos, sem exceção, em ações promotoras de sustentabilidade e resiliência. É nosso objetivo contribuir ativamente para munir a população com os conhecimentos necessários para a adoção de consumos mais conscientes, com opções mais sustentáveis, isto é, com raciocínio crítico. Além das várias ações que se prolongam durante todo ano, para toda a população, com especial destaque para a comunidade escolar, através do desenvolvimento de atividades, ações de sensibilização, produção de materiais pedagógicos e diversos eventos que pretendem alertar para as alterações climáticas e para as medidas de minimização dos seus riscos, está a ser preparada, no âmbito do Plano de Eficiência Hídrica do Algarve, uma campanha de sensibilização sobre o valor da água e, consequentemente, sobre o seu uso eficiente. Também muito em breve, apresentaremos uma nova plataforma web que atende a estes valores e objetivos, direcionada para o público escolar.
O aproveitamento de água para rega de espaços públicos e campos de golfe será uma prioridade? Quando começa a ser uma realidade na maioria da região?
Já há algum tempo que trabalhamos nestes projetos. Neste momento, temos o projeto da elevatória e distribuição de água residual tratada da ETAR de Vila Real de Santo António, preparado para pôr a concurso. Além deste, estão previstos outros sistemas na Quinta do Lago, em Vilamoura, Albufeira e Boavista, os quais temos vindo a trabalhar nas respetivas avaliações de risco, conforme previsto na atual legislação. Correndo tudo como está previsto, em 2025, serão uma realidade.
Estava previsto esse aproveitamento de água na ETAR da Companheira, em Portimão…
Portimão desde cedo mostrou interesse no aproveitamento de água residual tratada para rega de espaço verdes e lavagem de ruas. Trata-se de uma situação em análise técnica que temos vindo a trabalhar com o município e que poderá vir a ser uma realidade. Temos conhecimento de que a EMARP está também a efetuar um estudo tendo em vista o aproveitamento da água tratada na ETAR para rega de espaços públicos verdes.
Há outros investimentos ou projetos nessa ETAR?
O investimento efetuado nesta Estação de Tratamento, concluída e inaugurada em 2018, representou um investimento de cerca de 13,8 milhões de euros, cofinanciado por fundos comunitários no âmbito do Programa Operacional de Sustentabilidade e Eficiência no Uso dos Recursos (POSEUR). Nesta fase, está a ser considerada uma extensão do investimento, também neste local, de parques fotovoltaicos para produção de energia verde.
Qual tem sido a aposta a nível da energia verde?
As energias verdes representam verdadeiros benefícios para o ambiente, podendo ser consideradas inesgotáveis se as compararmos aos combustíveis fósseis, preservando desta forma os recursos esgotáveis, garantindo a manutenção dos ecossistemas, reduzem a incidência na emissão de gases poluentes responsáveis pelo efeito estufa, entre tantos outros benefícios. Na Águas do Algarve temos o princípio ético de contribuir para a manutenção do bem-estar da sociedade e para a preservação do ambiente investindo progressivamente nesta área, a qual é comum de todo o Grupo Águas de Portugal. Neste âmbito, desenvolvemos um Plano de Eficiência e de Produção de Energia (PEPE), que agrega um largo conjunto de medidas de eficiência energética e de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis com o objetivo de reduzir os consumos, aumentar a produção própria e melhorar as condições de aquisição de energia elétrica. Gostaria de destacar a vertente da mobilidade elétrica, com a aquisição de viaturas elétricas para a nossa frota operacional, a produção de energia elétrica renovável, através da instalação de quase uma centena de centrais fotovoltaicas em toda a região. Também a destacar a substituição integral de toda a iluminação artificial por uma iluminação baseada na tecnologia LED, entre outros. Também no alinhamento com a estratégia nacional para a neutralidade carbónica a atingir no ano de 2050, a Águas de Portugal é detentora de um projeto para a concretização na neutralidade energética em 2030 onde, a Águas do Algarve está naturalmente inserida. Temos como objetivo, até 2030, tornarmo-nos o primeiro operador regional do setor da água energeticamente neutro, reforçando a eficiência energética, produzindo energia elétrica a partir de fontes renováveis, resultando na eliminação 38 mil toneladas de emissões de CO2.
Porquê o investimento na secagem de lamas?
Com o investimento que tem vindo a ser efetuado na construção de novas ETAR, com processos de tratamento de lamas ativadas, o volume de lamas tem vindo a aumentar substancialmente. Por outro lado, os custos de mercado para o seu transporte e tratamento em destino final adequado não estabilizou em Portugal. Esta aposta surge numa estratégia de redução de 70 por cento da tonelagem de lamas a transportar, possibilitando o seu aproveitamento na melhoria de solos destinados à agricultura e contribuição para a economia circular.
Os consumidores da região serão penalizados com o aumento de custo da água?
O Plano de Recuperação e Resiliência prevê que o investimento nele contemplado, seja financiado a 100 por cento. Naturalmente e por questões técnicas, a dessalinização a partir do início do seu funcionamento, não deverá parar, introduzindo assim, custos de manutenção e de energia ao sistema. No entanto, é prematuro falarmos de aumento do custo da água, pois as sinergias ganhas no sistema poderão anular este balanço. Considero que se deverá aguardar pelo desenvolvimento dos estudos para concretizarmos esse assunto.