Ginástica rítmica do Clube Instrução e Recreio Mexilhoeirense já justifica espaço próprio para treinar

Texto: Hélio Nascimento | Fotos: Eduardo Jacinto, in Portimão Jornal nº37


Sabem que há ginástica rítmica na Mexilhoeira? E da ‘boa’? Pois é… o Clube Instrução e Recreio Mexilhoeirense orgulha-se de ser um dos únicos no Algarve que compete a nível nacional nesta modalidade, na sequência de um projeto iniciado no ano de 2000 e que tem crescido a olhos vistos, suscitando o interesse geral, de tal modo que hoje até já funciona, também, em Portimão, ultrapassando assim as fronteiras de uma freguesia que está bem e recomenda-se. 

As aulas começam na sede do clube, na sala do primeiro andar, de algum modo improvisada para o efeito e que serve, igualmente, para teatro e festas. Depois, prosseguem no pavilhão da Escola José Sobral, onde as ginastas dispõem de espaço suficiente para lançar os seus aparelhos, e, devido ao tal interesse já descrito, estenderam-se a Portimão e ao pavilhão da Escola Júdice Fialho. “O nosso sonho é dispormos de um local próprio, um pavilhão que dê resposta às ambições das atletas. Temos o local, cedido por um associado, agora é deitar mãos à obra, sabendo que o processo vai ser longo”, disse Ana Jorge, a presidente. 

Foi precisamente Ana Jorge, que além de ser a líder da coletividade também é diretora-geral e treinadora de ginástica, que recebeu a reportagem do Portimão Jornal, interrompendo, por momentos, a primeira aula da tarde. E, embora não se possa dizer que a história do Mexilhoeirense se cruza, na plenitude, com a dela, a verdade é que os laços são cada vez mais ‘apertados’, reveladores da resiliência de uma entusiástica adepta da ginástica. 
 
Dos bailaricos à ginástica de competição 
O clube nasceu em 30 de janeiro de 1950 e hoje, mercê de uma muito maior divulgação, evoluiu imenso e tem mais atividades. Começou por funcionar no rés do chão, onde está instalado o bar, e depois ‘cresceu’ com a construção do já mencionado primeiro andar. “O Mexilhoeirense era apenas uma coletividade recreativa, que tinha música, bailes, festas e algum teatro. Sei que o grupo musical ‘Gatos Pretos’ até foi criado de propósito”, conta Ana Jorge. Na altura não havia atividades de caráter desportivo e o futebol, seguido do karaté e da ginástica, só aparecem bem mais tarde. 

“O nosso sonho é dispormos de um pavilhão que desse resposta
às ambições das atletas. Temos o local, cedido por um associado, agora é deitar mãos à obra, sabendo que o processo será longo” 

“Como cheguei aqui? Foi através do professor Rui Caipira, que na altura era o presidente do clube. Cruzámo-nos num curso de treinadores, em Lisboa, e, como somos os dois de Portimão, ele acabou por me convidar para vir dar aulas”, recorda Ana Jorge, a propósito da sua ligação a um dos emblemas mais populares e até carismáticos do concelho. 
 
Início de ‘conjuntos’ está para breve 
Os resultados desportivos da ginástica rítmica são assinaláveis, atendendo aos condicionalismos da região e em particular às condições de trabalho. “Já obtivemos um quinto e sétimos lugares, em campeonatos individuais da I Divisão, para além de outros bons resultados a nível distrital. A nível nacional é mais difícil”, reconhece Ana Jorge. O clube, de resto, não compete em conjuntos. “Para o ano vamos iniciar as nossas participações em conjuntos, o que envolve ter cinco ginastas nos diversos aparelhos. Mas já temos feito exibições, nas Taças do Mundo, aqui, em Portimão, em torneios internacionais e outros festivais”. 

As aulas que funcionam agora no pavilhão da Escola Júdice Fialho, em Portimão, vieram de encontro às muitas solicitações de pessoas que queriam fazer ginástica e não tinham meios de se deslocar à Mexilhoeira. Ao todo, o clube tem 75 atletas, só na ginástica, 19 na competição. A captação é feita através da divulgação nas redes sociais e passa “palavra, porque muitas das meninas estão connosco há muitos anos”. Dos 3 aos 17 anos, há lugar para todas, mas… nada de rapazes. “Em Espanha já existem classes masculinas a fazer competição de rítmica, mas por cá ainda não”, embora os primeiros passos estejam a ser dados nesse sentido.   

A estrutura da modalidade no Mexilhoeirense está montada e tem diversos intérpretes, começando logo com algumas parcerias estabelecidas, nomeadamente com um psicólogo, médico, nutricionista, fisioterapeuta e professora de ballet, para além de quatro técnicos ‘residentes’. 
 
Modalidade exigente e que requer muito treino 
Além da ginástica (a rítmica e a destinada a seniores), o clube tem várias outras atividades: powerfit, zumba, fisiopilates, reeducação postural, yoga, psicomotricidade, ballet e tiro com arco, uma modalidade em desenvolvimento, mas que luta com algumas dificuldades, no que se refere ao espaço, pelo que os treinos têm decorrido em Lagos. Numa vertente mais cultural, destaque para o curso de guitarras (polo da Orquestra Juvenil de Guitarras do Algarve), grupo de cantares e aulas de fado. 

A ginástica, porém, é agora o principal cartão de visita do Mexilhoeirense em termos desportivos. E as aulas, como já deu para perceber, obrigam a… muita ginástica. “Até 2008 não houve problemas, mas depois, com o arranque dos mega agrupamentos e uma nova direção na escola, ficou mais difícil a gestão do pavilhão da Escola José Sobral, o que se agravou com a chegada da pandemia”, conta Ana Jorge. As atletas só em dois dias por semana e a partir das 18 horas é que podem utilizar o espaço, o que é manifestamente pouco para uma modalidade tão exigente e que requer muitas horas de treino. 

As atletas começam as aulas na sede por volta das 16h30, depois vão a pé para o pavilhão e regressam mais tarde ao local de partida para se vestirem. “Elas aqui não conseguem lançar os aparelhos. Fazem o aquecimento, alguns exercícios, mas não concluem o treino. Temos de conciliar os horários e perceber o que sobra para nós. O espaço é diminuto. O pavilhão? É uma obra dispendiosa. Temos já o terreno, disponibilizado por um sócio, mas está fora do perímetro de viabilidade construtiva, o que é um entrave, e, depois, precisamos de apoios financeiros. Não é fácil”, vinca Ana Jorge, sem atirar a toalha ao chão. 

As meninas da competição, que são 19 no total, treinam todos os dias e descansam ao domingo. As outras classes evoluem duas vezes por semana, tal como sucede na maioria das restantes atividades.  

Ser presidente dá mais trabalho 
Ana Jorge define-se como uma amante da modalidade, que tem “feito tudo para elas serem melhores”. Fez competição, a nível escolar, com a professora Armandina Fortes, e foi a partir de então que nasceu a grande paixão. Licenciada em Educação Física, tem o curso de treinadora, o grau 2 de ginástica para todos e de rítmica, bem como os de sénior gym e baby gym, cursos da federação que englobam todas as especialidades. É, também, a diretora-técnica do Mexilhoeirense.  

“Ser presidente dá mais trabalho, porque há muita coisa para gerir, desde o bar aos funcionários e incluindo todos os trâmites legais. Os associados já são muitos e os mais antigos não têm noção do que agora é preciso a nível de burocracia”, explica a professora, de 42 anos, sempre pronta a enfatizar “o grande gosto pela modalidade e a vontade de que clube evolua enquanto aqui estiver e puder”. 

“Para o ano vamos iniciar as participações em conjuntos,
o que envolve ter cinco ginastas nos diversos aparelhos. Mas já temos feito exibições nas Taças do Mundo e em torneios internacionais”

A coletividade contabiliza cerca de 1000 sócios, mas só metade é que paga as quotas. “Não ligo muito ao que dizem. Quando tomo uma decisão é com gosto e tenho a certeza que faço bem e em prol de todos”, prossegue, admitindo que “algumas barreiras, de início, foram sendo ultrapassadas”. 

O grande objetivo, já se sabe, é o pavilhão, para a ginástica e para as outras modalidades. “Mais do que os resultados, embora estes também importantes, o pavilhão possibilitaria melhorar as condições de treino e ajudar à evolução das atletas. A modalidade é exigente, já o disse, e vamos sempre trabalhar para alcançar alguns resultados, mas é difícil a nível nacional”. O sonho, porém, ainda comanda a vida!

Carrinhos de rolamentos de volta e em dose dupla 

Um dos mais populares eventos organizados pelo Mexilhoeirense é a corrida de carrinhos de rolamentos. Interrompida devido à pandemia, vai voltar e em dose dupla. “Contamos levar a efeito uma primeira corrida no dia 24 de abril, de caráter mais pequeno, e em setembro a grande prova”, revela Ana Jorge. E há mais: a Festa de Natal, a gala no TEMPO, nos dias 11 e 12 de fevereiro, um concurso de fado, e, em agosto, o tradicional ‘Artes e Sabores’, para além do sarau anual. Em suma, “queremos retomar o que esteve parado”. Na freguesia existe o Clube de Futebol da Mexilhoeira, que esteve inativo e agora reiniciou a atividade (só futebol), enquanto em termos de ginástica apenas o AGRP participa também em competição, já que os outros clubes promovem ações de lazer e lúdicas. “Fazer provas no Algarve é complicado. Temos de pedir a juízes para se deslocarem, porque um painel necessita de dez juízes e os que cá temos não chegam a esse número. A Associação, por sua vez, vai dando algum apoio”. Ana Jorge refere ainda a “boa relação com a Câmara Municipal de Portimão, que tem ajudado, através dos contratos-programa, tal como a Junta de Freguesia da Mexilhoeira Grande, sobretudo a nível de transporte, uma vez que as provas se realizam todas fora do Algarve”.  


Matilde: o curso de medicina fala mais alto

Matilde Freitas tem 17 anos e pratica rítmica desde 2013. Também fazia ballet, cuja professora reparou na sua flexibilidade e potencialidade para se dedicar à ginástica. “Disse-me que devia experimentar e durante algum tempo pratiquei as duas modalidades, mas depois tive de optar, porque, com os estudos, não dava para conciliar tudo. Optei então pela ginástica”, conta a jovem, durante uma breve pausa do seu treino. Em competição desde 2018, já arrancou sétimos lugares em bola, um quinto em fita e um sétimo na geral. 

Agora, tudo o indica, aproxima-se o adeus à competição. “Estou no 12º ano e vou entrar para a universidade. Quero seguir um curso superior e terei de ir para Lisboa ou para outro país”, diz Matilde, que pretende seguir medicina. Na circunstância, pisca o olho a Espanha. “Tenho média de 17 valores, o que para cá pode não chegar, por isso é possível que vá para Espanha. Se assim for, terei de aperfeiçoar a língua”, garante, expressando “alguma pena” em deixar a rítmica de competição. 

Matilde é de Lagos e todos os dias se desloca à Mexilhoeira, com mais duas colegas (“vamos trocando boleias”), para os seus treinos. Um esforço de se lhe tirar o chapéu. “Praticamente, só nós é que competimos no Algarve. Lá em cima existe mais tarimba e experiência”, adverte, prometendo que continuará na ginástica, com um caráter de lazer.  

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