Joaquim José Barão Carneiro: o associativismo está-lhe no sangue

Texto e Foto: José Garrancho
Joaquim José Barão Carneiro nasceu em Estômbar, no concelho de Lagoa, já lá vão 85 anos bem medidos, cumprindo o seu 86º aniversário no próximo dia 10 de julho. Em criança, durante três anos, pertenceu ao Grupo Nacional de Escutas de Estômbar e, mais tarde, frequentou o curso comercial da Escola Comercial e Industrial de Silves.
No entanto, não foi só na área profissional que se distinguiu. Foi também no associativismo, pois, desde muito novo que se dedicou a diferentes movimentos nesta vertente da sociedade. Foi um dos sócios fundadores do Núcleo Sportinguista Estombarense, em 1953, ainda estudante, embora a sua fundação legal tenha acontecido somente em 1957, com a aprovação dos estatutos pelo Estado Novo.
Presidiu à Santa Casa da Misericórdia de Estômbar, no biénio 1958-1959, pertencendo também ao grupo da Igreja que organizava as festas em honra de Nossa Senhora das Dores e São Tiago. Já em 1960, concorreu à Direção da Sociedade Recreativa Capricho Estombarense, tendo efetuado obras de vulto que melhoraram as condições para os associados.
Dois anos mais tarde, assumiu a reparação da instalação elétrica da Igreja de Estômbar, que estava muito degradada, substituindo e aumentando o equipamento. Contou com a ajuda de um amigo, eletricista, que ofereceu a mão-de-obra. Como, por essa altura, fazia a contabilidade da empresa de material elétrico de António Monteiro, na Rua Diogo Tomé, este fez-lhe um preço especial. Também conseguiu andaimes por empréstimo. “Ainda está lá, ao fim de mais de 60 anos”, afirma o empresário, cujo percurso se reparte pelos concelhos de Lagoa e Portimão.
Aliás, em 1980, foi admitido como associado da Santa Casa da Misericórdia de Portimão, fazendo parte do grupo, capitaneado pelo provedor José Manuel Monteiro Correia e composto por José Francisco Serralha, capitão Paulo Neto, Silvestre e Manuel de Almeida, que levou a cabo a renovação e desenvolvimento da instituição. Veio a ser vice-provedor durante 25 anos.
Quase ao mesmo tempo, formaram o grupo que concorreu à Direção da Casa de Nossa Senhora da Conceição, procedendo a um vasto plano de apoio e recuperação e, mais tarde, à construção das atuais instalações.
Não se ficou por esta área da solidariedade, até porque, em 1988, foi convidado para integrar os corpos sociais da Associação Naval Infante de Sagres, hoje Clube Naval de Portimão, por um dos fundadores, tendo concorrido depois à presidência, no biénio 1991-1992. Desenvolveu melhorias na vela, remo, windsurf, pesca ao fundo e motonáutica, com a promoção de torneios nacionais e internacionais. A primeira sede, cedida pela Junta Autónoma dos Portos do Barlavento do Algarve, não tinha condições para convívio dos associados, porque também armazenava as embarcações. Barão Carneiro conseguiu a transferência destes equipamentos para outro armazém, melhorando muito as condições da sede.
Ainda em Portimão, corria o ano de 1997, foi convidado a colaborar com o Núcleo do Sporting, que se encontrava numa situação periclitante. Pela sua mão, iniciou-se um processo de renascimento e vitalidade e, com o seu apoio financeiro, bem como de alguns sócios e da banca, a coletividade adquiriu a primeira sede, onde se manteve durante cerca de cinco anos. Isto porque, em dezembro de 2002, patrocinou, em conjunto com outros associados e o auxílio da banca, a nova sede, com dois pisos, na Rua Infante Dom Henrique, para oferecer melhores condições aos sócios.
“Iniciámos, depois, várias modalidades, como o futsal, cicloturismo, onde chegámos a ter 150 elementos de todo o Algarve numa prova, torneios bianuais de sueca e de snooker, visitas anuais a Alvalade”, descreve.
Da fábrica de conservas a empresário da construção civil
“Em 1955, ainda frequentava o curso comercial, fui convidado para trabalhar nos escritórios da fábrica de conservas de peixe Severo Ramos, Lda, empresa onde o meu pai já trabalhava na caixotaria. Foi o início da minha vida profissional. Quando lá cheguei, fui o empregado de todos e todos me ajudaram”, conta o ‘menino Joaquim’, como era carinhosamente tratado pelas conserveiras, que lá trabalhavam.
Saiu em 1980, quando a empresa já se encontrava com dificuldades económicas e dívidas à Caixa de Previdência. A morte prematura de Judite, a sua esposa, diretora da Escola do Malheiro, levou-o também a uma mudança na sua vida profissional.

“Tirei um curso de Contabilidade por correspondência, entre 1968 e 1970, na Federação Regional dos Sindicatos dos Empregados de Escritório do Sul, e comecei a fazer a ‘escrita’ de algumas empresas. Ao mesmo tempo, fui representante da Inter-Ibéria, uma empresa de exportações, com conhecimento e autorização dos meus patrões, comprando conservas a diferentes fábricas locais para eles exportarem”, recorda.
Joaquim Barão Carneiro inicia-se no setor da construção civil em 1973, por um acaso. “Fazia a escrita de Manuel Selada, que me veio dizer que um dos outros sócios não tinha conseguido chegar a acordo com o dono de um terreno e abandonara uma obra a iniciar, havendo ali uma possibilidade de negócio para nós”, conta o empresário.
“Falei com o proprietário, engenheiro civil de Loulé, chegámos a acordo, elaborámos o contrato e iniciámos os trabalhos. Pouco tempo depois, ainda nem tínhamos colocado a primeira placa, deu-se o 25 de Abril. Um dia, chego à obra e o meu sócio disse-me que ia desistir, porque um pedreiro, delegado sindical, tinha vindo exigir aumento salarial e férias para todos e, desse modo, perdíamos dinheiro. Acalmei-o, reuni com o proprietário e consegui renegociar o contrato. Eu, na hora do almoço, comia à pressa e ia ajudar na obra. Acabámos por fundar a Sociedade de Construções Cerca do Colégio, com mais dois sócios”, descreve.
Estavam a meio da obra e, pelas suas contas, iam ter lucro, quando apareceu a oportunidade de comprar um terreno do senhor Mimoso, seu ex-patrão. Foram à banca, arranjaram o dinheiro necessário e avançaram. Entre aquisições e permutas, construíram cinco blocos de apartamentos em Portimão e três em Armação de Pêra, num total de cerca de 300 frações.
Foi então em 1988 que iniciou atividade da empresa Baltamar – Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, Lda, em sociedade com os seus dois filhos. O empreendimento de maior vulto consiste nos seis lotes junto ao Mercado Municipal da Avenida São João de Deus, numa zona central da cidade, compostos por 156 frações.
Existem, porém, mais quatro edifícios construídos por si na cidade, incluindo o Aparthotel Plaza Real. No total, são cerca de 300 frações. E, entretanto, já iniciou aquele que garante ser o seu último projeto, a Urbanização São Sebastião, entre a Escola Básica Major David Neto e o Centro de Saúde, que se distingue pelos espaços públicos e ajardinados, com diversas árvores e canteiros, que pretendem embelezar a zona.
‘’O lote original do terreno tinha 14 440 metros quadrados, dos quais ofereci 700 metros quadrados à autarquia para fazer a rua de acesso ao Centro de Saúde, facilitando a vida aos utentes, e 120 espaços de estacionamento. No lote, serão construídos apenas três edifícios de quatro andares, com 80 residências dos tipos T2 e T3. Será algo para embelezar a cidade e para me encher de orgulho. Depois, não faço mais nada, deixando o legado aos meus filhos’’, assegura o empresário já com 85 anos em declarações ao Portimão Jornal.
Sá Carneiro como um exemplo de “verticalidade”
Joaquim Barão Carneiro partilha ainda a história do seu envolvimento na política. “No tempo da ‘outra senhora’, tinha eu cerca de 18 anos, um senhor por quem nutria consideração levou-me para a Junta de Freguesia de Estômbar, onde estive um ano. Não tinha qualquer noção de política”, descreve. E houve um episódio que o levou a decidir sair da autarquia. “Houve umas eleições, no inverno, e o referido senhor, sentado à secretária, olhava e, à medida que alguns eleitores iam passando na rua, dizia: ‘Fulano não entrou; ele ainda cá vem. A família tal, esses também vêm sempre cá votar’. E ia dando baixa dos nomes, já próximo do fecho das urnas. Aos 18 anos, já tinha a minha personalidade formada e não podia admitir batota. Abandonei o cargo”, alega. Não deixou, contudo, a vida política e até foi um elemento ativo durante vários anos. “Entrei no Partido Social Democrata pela mão do senhor Barros, do Banco Nacional Ultramarino, porque fui conquistado por Sá Carneiro, cuja verticalidade admirava. Fui deputado municipal durante quatro mandatos, mas nunca fui fanático e sempre me dei bem com elementos das outras forças políticas. Um dos meus amigos, com quem lutei em conjunto contra algumas situações que considerava erradas, embora tenhamos ideologias opostas, foi o Rui Sacramento, do Partido Comunista Português”, confidencia.