Lagoa soma campeões nas corridas de pombos-correio
Texto: Gonçalo Coelho | in Jornal Lagoa Informa nº 158
A columbofilia é uma arte que parece estar a perder adeptos, mas em Lagoa há uma associação que persiste e luta contra a maré. Soma campeões e praticantes entusiastas que não querem deixar morrer esta atividade.
O Lagoa Informa esteve na Sociedade Columbófila Lagoense para perceber se a arte de treinar e fazer corridas com pombos-correio continua com dinâmica. Este desporto consiste em criar, cuidar e competir com pombos-correio, também conhecido como pombo-das-rochas, tendo em Portugal um histórico de competições e de títulos consideráveis– sendo muitos desses campeões do Algarve e alguns de Lagoa.
Os competidores desta arte parecem ser os mesmos já há algum tempo, transmitindo a ideia que este é um desporto para os mais velhos, uma vez que os mais novos parecem não mostrar tanto interesse ou capacidade de participar neste tipo de competições.
Um dos columbófilos da região do barlavento algarvio, Carlos Grade Santos, que domina a liderança das competições já há algum tempo, em conversa com o Lagoa Informa, diz que, para se ser columbófilo de competição “é preciso bastante investimento nos pombos, ao nível das comidas e rações, na saúde das aves, em termos de medicamentos antibióticos e tratamento veterinário, na construção dos pombais, assim como a nível de tempo e disponibilidade no que toca a treinar e a educar esta espécie, dotada de extrema inteligência e excelentes capacidades”. Ainda que limitados às suas capacidades voadoras, os pombos-correio recebem o seu nome precisamente da função que ocupavam.
“Eram os correios da altura. Em diversos momentos da história, como por exemplo na primeira e segunda guerras mundiais, entre outras ocasiões onde, por exemplo, a internet não era um dado adquirido como hoje a podemos comtemplar, os pombos-correio foram, e em alguns sítios continuam a ser, meios de comunicação para troca de mensagens importantes, e por vezes secretas. Mas, como é que os pombos-correio realizam esta proeza, isso é que parece ser um mistério”, revela Carlos Grade Santos.
No entanto, e na verdade, os pombos-correio não sabem ao certo para onde ir, mas sabem certamente para onde voltar: para casa. Estas aves têm a capacidade de regressar ao seu ninho, mesmo a distâncias consideráveis, que por vezes podem atingir mil quilómetros de distância.
‘Magnetoreceção’
“Ao saberem para onde voltar, para um local seguro e protegido onde encontram alimento e a companhia do seu bando, os pombos-correio podem ser transportados para outros lugares do território, dentro de caixas e gaiolas, a fim de, com a ajuda de anilhas colocadas nas suas patas ou com suporte de pequenas mochilas colocadas ‘às costas’, poderem transportar pequenos fragmentos de papel com mensagens escritas, ou outros elementos capazes de serem transportados por este animal voador”, explica.
Dizem os especialistas que, tal como muitas aves do nosso planeta, os pombos-correio, utilizam a chamada ‘magnetoreceção’ para regressar aos seus portos-seguros.
Esta perceção consiste em detetar os campos magnéticos do planeta Terra para perceber a sua posição geográfica, a sua altitude e a sua direção, e assim, poderem perceber onde estão e colocarem-se na direção certa para regressar a casa. E é com base nestas capacidades naturais dos pombos-correio que se fazem as corridas de pombos, calculando o tempo médio que demoram a percorrer uma quantidade de quilómetros.
Campeões na terra
Um competidor que está em crescendo no terreno de provas nacionais e internacionais de columbofilia é Nuno Rocha, que explica ao Lagoa Informa como se dividem as competições: “Nestas provas de voo que podem saltar fronteiras, existem as de velocidade, onde a distância percorrida vai até os 300km; as de meio-fundo, que vão desde os 301km até os 500km; as de fundo, dos 501km até aos 800km; e finalmente as de grande-fundo, também conhecida por Absoluta, que são mais de 800km de distância de voo”.
No momento em que foi realizada esta reportagem, na Sociedade Columbófila Lagoense eram registadas as dezenas de pombos que iriam regressar às suas casas dois dias depois, vindas de outros pontos da Península Ibérica. Nos seus seis anos de experiência em competição columbófila, Nuno Rocha já foi campeão nas categorias de velocidade, meio-fundo e fundo.
Na maior solta de pombos-correio da Europa, que decorreu a dia 22 de maio, onde foram postos a voo cerca de 60 mil aves a partir de Valência com destino a Portugal, Nuno ficou em 40º lugar, numa lista de aproximadamente oito mil columbófilos. No meio deste frenesim de registo de pombos-correio, mostrou-nos a beleza e envergadura destas aves que são, de facto, animais robustos, e deu-nos também a entender que a columbofilia é uma modalidade de competição onde participam poucos jovens.
Nelson Borralho, campeão de ‘yearlings’ da zona do Barlavento, em 3º no distrital, um dos mais jovens praticantes do concelho, confirma que “este é um desporto praticado pelos mais velhos, onde se vai perdendo competidores mais jovens à medida que o tempo passa. É preciso muita disponibilidade e este desporto está a ficar mais caro”, salienta.
Columbófilo desde 1971
Fernando Figueiras, natural da Mexilhoeira da Carregação, e atual presidente da Sociedade Columbófila Lagoense, já é columbófilo desde 1971. Começou aos 15 anos a cuidar de pombos-correio, sendo uma paixão que tem vindo a nutrir pelas aves, depois de ter visitado uma exposição de columbofilia nessa altura. Recebeu-nos numa sala da associação onde é difícil não ver os troféus já conquistados pelos amantes da modalidade do concelho e arredores, explicando como se iniciar nesta arte.
“O primeiro ano é para arranjar os pombos, para começar a tratar deles e criar relação com o ninho e com o bando. No segundo, já se começa a competir”, revela, ele que é uma das referências da columbofilia no concelho e na região. Nos últimos seis anos, ganhou quatro campeonatos gerais, a competição que todos querem vencer.
“Quem vai para o ar, avia-se em terra”
Euletério Faleiro, um ‘ancião’ da arte de criar e cuidar de pombos-correios, explicou à nossa reportagem que para estas aves voarem grandes distâncias e ‘rasgar’ os céus a alta velocidade, muito trabalho tem de ser feito em terra. “Quem vai para o ar, avia-se em terra”, diz. “É preciso ter em consideração que há muito trabalho de preparação, controlo e registo destes corredores do ar que deve ser feito antes de os soltar, de forma a que possam correr nas diferentes modalidades de competição. Primeiro, assim como nós, seres humanos, cada pombo é, obviamente, um pombo único e, como nós, que temos cartão de cidadão com um número que nos pertence, os pombos têm também eles números de registo que lhes são únicos. E, da mesma forma que se passou de utilizar pombos-correio como meio de comunicação para se utilizar telefones com internet, o registo e controlo destes pombos passou igualmente do tradicional ‘papel e caneta’ para um conjunto de tecnologias de registo e controlo destes animais”, explica.
Com uma anilha que possui um chip, colocada numa das patas dos voadores, “pode registar-se no computador o número associado a cada pombo que irá participar nas competições”, acrescenta, mostrando algumas das máquinas e engenhos de considerável avanço tecnológico que são utilizados nas competições, as chamadas ‘antenas’.
Há também que agradecer “os avanços tecnológicos que possibilitam o registo e controlo destes voadores para que, por exemplo, se possam registar os tempos dos pombos até à centésima de segundo, em tempo real, assim como para saber se todos os pombos estão no sítio certo e, quais pertencem a quem”, e a partir daí poder traçar as tabelas com os resultados dos competidores.