Opinião: Bazuka (1) ou bazófia (2)
João Reis | Professor, in Lagoa Informa, nº 161
Há tempos, em conversa descontraída com amigos, dei comigo a explicar-lhes como a discussão dos Orçamentos de Estado se assemelha à apresentação de uma receita culinária, por exemplo, ‘Bacalhau à Brás’ que todos os convivas aceitam, à partida. Mas, diz um “Não posso comer bacalhau salgado, por causa da tensão alta”. Diz o cozinheiro “Tá bem; será do fresco”. E diz outro “E eu não como batata frita; sobe-me o colesterol”. “Não há problema”, disse o chef , “põe-se cozida”. Outro, ainda, queixou-se “Leva ovos; não quero, por causa da albumina”. “No problem! Mete-se natas”, decidiu o mestre da cozinha. Claro que, dali, não resultaria nenhum ‘Bacalhau à Brás’; quanto muito, poder-se-ia chamar-lhe ‘Bacalhau à Costa’, por exemplo.
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Porquê este preâmbulo? É que – já todos sabemos – vem aí dinheiro, muito dinheiro! Que, de alguma forma, já está ‘orçamentado’ ou, pelo menos, ‘destinado’, no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) da autoria do Eng. António Costa (que também é Silva).
Só que, maus hábitos levam a que, dos Planos e Orçamentos aprovados até à sua execução, surjam alterações para satisfazer ‘compadres’, o que nos remete para o exemplo do ‘Bacalhau à Costa’.
Por ser “muito dinheiro”, a gente preocupa-se, como é natural, e quer saber como vai ser usado… Para os próximos sete anos, são-nos distribuídos 30 mil milhões de euros a que se juntam mais 15 mil milhões em subvenções. Total = € 45 mil milhões (45 seguido de 9 zeros…) sendo a maior parte “a fundo perdido”, isto é, é DINHEIRO DADO – não teremos de o devolver nem de amortizá-lo . E o que fizemos para merecer tal generosidade? Nada, absolutamente NADA. Excepto termos continuado pobres e atrasados. E, claro, pedintes, sem mérito!
É uma situação triste, humilhante, vexatória que, aliada a uma compreensível falta de confiança na forma da aplicação daqueles montantes, resulta num pesado sentimento de desânimo e desespero. Responsáveis? Há-os, com certeza; muitos, talvez todos nós incluídos, nós, ‘nobre Povo, Nação valente’, que não temos sabido dar um pontapé na resignação nem uma grande palmada na mesa da passividade.
Ao contrário de outros países da União Europeia, que chamaram as suas melhores empresas do sector privado para coordenarem a aplicação inteligente das verbas ‘bazukais’ que também lhes couberam, em Portugal o Governo optou por ser ele a orientar tal aplicação.
Do que vem sendo anunciado, já vamos tendo algumas ‘pistas’ de como o dinheiro vai ser gasto(3) – mais Função Pública, com remuneração mais atractiva e mais rápida progressão na carreira (fica o Estado mais dispendioso…); atribuição de verbas para “compor” o próximo Orçamento de Estado e, assim, cumprir promessas eleitorais do partido (sem o que não seriam cumpridas); programas de apoio aos desfavorecidos das áreas de Lisboa e Porto (que o resto é paisagem…); entrega, por empréstimo, de 600 000 computadores a alunos e professores (fica por aqui a atenção dada à Educação?); decerto, outras medidas do mesmo jaez, que pressupõem ou implicam um derramar de euros sobre os problemas, resolvendo-os temporariamente, quando seria mais congruente e adequado investi-los em meios e áreas que promovam reprodução, multiplicação, crescimento, em suma, um verdadeiro e perene desenvolvimento.
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À LAIA DE EPÍLOGO
Exmºs Srs. Políticos, de todos os partidos (e independentes), quaisquer que sejam as funções – neste momento, não há tempo para discutir ‘esquerdas’, ‘direitas’ ou ‘centros’. Há é que questionar o bom-senso ou a falta dele. É preciso que entendam que o NOSSO PAÍS está numa situação de “AGORA OU NUNCA” e é urgente (e possível, se honestamente quiserem) atentar em: 1º-reformar; 2º-REFORMAR; 3º-REFORMAR (4) – a qualificação profissional e cívica dos Portugueses; a qualidade do tecido empresarial e dos empresários; a Educação (de alto a baixo) que nos facultará melhor cultura, nova mentalidade e maior capacidade de criar um real progresso. Se não o fizerem, a ‘bazuka’ com que, agora, nos acenam será uma pura e mal intencionada BAZÓFIA.
Tentem merecer os PORTUGUESES que representam!
Notas
(1) Arma antitanque; acertando no alvo, rebenta aquela “porcaria” toda…;
(2) Fanfarronada, gabarolice, fogo-de-vista;
(3) Não é o mesmo que “investir”;
(4) Reconstruir, reestruturar.
- Artigo escrito sem a aplicação do novo acordo ortográfico.