OPINIÃO | Um velho ano de 2023
Pedro Manuel Pereira | Historiador, in Portimão Jornal nº64
Na sequência da pandemia de um vírus nascido há cerca de três anos, o covid, órfão de pai e de mãe, uma vez que até hoje não há laboratório ou país que assuma a sua paternidade, o que só pode dever-se ao pudor ou modéstia do progenitor de tal aborto, que deu cabo da economia, do equilíbrio político e estratégico/militar entre nações e, sobretudo, da vida de milhões de pessoas, o panorama político/económico/social em Portugal vem-se agravando, acompanhando a cronologia de vida do aborto.
É evidente que o país não vive isolado. É parte integrante do maquinismo enferrujado que (ainda) tenta gerir a caduca ordem mundial, enquanto a vida do governo da nação, observada por quem vive fora das suas fronteiras, mais parece uma telenovela mexicana de faca e alguidar, dobrada em brasilês.
Para os que habitam dentro de fronteiras, exceptuando os que comem à mesa do orçamento, o governo português assemelha-se a um albergue espanhol, em que a desoras entram uns (e umas) e saem outros(as) ou os mesmos, – como uma senhora secretária de estado, que após tomar posse, pouco mais de vinte e quatro horas depois, abandonou o cargo – e quando saem, vão de caminho normalmente para o parlamento, onde continuam a trabalhar à sombra das boas aventuranças governativas, ou então, numa empresa pública ou outra que trabalhe a expensas do Estado, que o mesmo é dizer, dos contribuintes portugueses.
No contexto deste cenário idílico/político, o 1º ministro em Janeiro de 2022 anunciou que vinha aí uma bazuca de milhares de milhões de euros provindos de Bruxelas, para injectar na débil economia portuga. Pouco depois, em 24 de Fevereiro, começou a guerra na Ucrânia e pelos vistos a tal de bazuca foi para esse país que, aliás, já levou não uma, mas milhares de bazucadas, morteiradas e mísseis que os irmãos russos lhe ofereceram e continuam a ofertar. Por sua vez, os amigos americanos, mais a UE, oferecem-lhes carradas de bazucas, morteiros, mísseis, carros de assalto e outros artefactos bélicos para trocarem com os invasores.
Dado que a guerra na Ucrânia serve como alibi para papalvos acreditarem que a crise económica e a inflação associada se devem a esse facto, o povo português, manso e ordeiro, não obstante as acções de rua e outras por banda de algumas associações profissionais (professores, polícias, trabalhadores do sector social, enfermeiros e outros profissionais de saúde, tripulantes e funcionários da TAP…) aceita sem tugir nem mugir, grato e reverente, as esmolas que o governo distribuiu nas últimas semanas de 2022, à laia de compensação paliativa face aos custos exagerados dos bens de primeira necessidade, em parte, à pala da inflação e por outro lado, por via da especulação criminosa de alguns agentes económicos.
Melhor andaria o governo se em vez de dar esmolas, eliminasse as taxas do IVA sobre os produtos alimentares e bens de primeira necessidade, medida que o governo espanhol presidido por Pedro Sanchez, seu correligionário político, tomou recentemente, anunciando dia 28 de Dezembro passado, um novo pacote de medidas, a fim de contribuir para combater a escalada da inflação. De entre as medidas anunciadas conta-se a isenção do IVA sobre alimentos básicos, como pão, queijo, ovos, leite, fruta, legumes e leguminosas, batatas, cereais e outros durante seis meses e a redução de 10% para 5% em alimentos como azeite e massa.
Assinale-se que o governo espanhol também aprovou em Conselho de Ministros, um aumento de 8,5% para as pensões, de forma a garantir o poder de compra dos reformados.
Além destas medidas, prolongou a redução do IVA sobre o gás e a electricidade para 5%, medida que se encontra em vigor, que terminava no final de 2022, mas que o governo espanhol resolveu manter.
De certeza que o cofre do Estado português tem margem financeira mais do que suficiente para poder tomar medidas semelhantes às do governo espanhol, porque os impostos resultantes da subida dos preços devido à inflação, tal como os dos combustíveis e demais bens de consumo, tem ultrapassado em muito, as receitas orçamentais previstas.
Face à realidade do quotidiano que, entretanto, se continua a viver em Portugal, os argumentos da treta do 1º ministro Costa, dirigidos ao “bom povo português”, quanto à inflação desenfreada e o custo de vida associados ao mal-estar e mau viver dos cidadãos, são “conversa para boi dormir” como se diz no Brasil, país irmão. Já não colam. São uma trampalhada.