Paulo de Morais: “A minha primeira ação será convocar o Parlamento para definir uma estratégia de combate à corrupção”

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Cerca de 90 por cento dos portugueses acha que o maior problema da política, em Portugal, é a corrupção. As pessoas perceberam, hoje, que se vive mal. Se há quem receba pensões de 230/240 euros, tal deve-se muito ao muito dinheiro que o Estado gastou nos fenómenos de corrupção – BPN, BPP, BES, submarinos, Expo 98, Campeonato da Europa de Futebol 2004, entre outros”, afirma Paulo de Morais, candidato às eleições presidenciais, em janeiro de 2016, nesta segunda parte da entrevista concedida à Algarve Vivo, em Lagoa.

Texto: José Manuel Oliveira

Foto: Eduardo Jacinto

O que está a fazer nesta fase da pré-campanha eleitoral para as eleições presidenciais, as quais se realizam no mês de janeiro de 2016?

Estou a contactar os eleitores desde o dia em que apresentei a candidatura. Houve uma primeira fase, entre abril e outubro, na qual ainda estamos, que foi uma tentativa de organização de toda a estrutura. Até por força da lei, existe um conjunto de procedimentos que necessitamos de ter, desde logo ao nível financeiro e da recolha das assinaturas. Nestes primeiros três, quatro meses tivemos como objetivo criar o modelo organizativo da campanha. Mas o processo de contacto com os eleitores iniciou-se logo. Portanto, desde o final de abril tenho andado a contactar os eleitores fundamentalmente por três vias – através dos jornais, televisões e rádios; das redes sociais; e em pequenas tertúlias ao longo de todo o país.

O que lhe dizem as pessoas?

As pessoas no geral aderem às causas que eu defendo. Apresentei as linhas programáticas da minha candidatura logo em abril e que são quatro – combate à corrupção, combate à mentira, luta pela transparência e repegar um conjunto de princípios constitucionais que têm sido esquecidos. As pessoas colocam questões e tenho aprendido muito com os debates que motivo aos eleitores. Tem corrido muito bem no sentido em que tem sido até agora uma campanha de troca de ideias, que é aquilo que acho que se deve fazer numa campanha eleitoral. Fujo muito a iniciativas espalhafatosas, circenses. Acho que em nada engrandecem a democracia.

Qual é a principal preocupação que nota nas pessoas?

Cerca de noventa por cento dos portugueses acham que o maior problema da política, em Portugal, é a corrupção. E eu concordo, plenamente, com eles. As pessoas perceberam, hoje, que se vive mal. Se há quem receba pensões de 230/240 euros, tal deve-se muito ao muito dinheiro que o Estado gastou nos fenómenos de corrupção – BPN, BPP, BES, submarinos, Expo 98, Campeonato da Europa de Futebol 2004, entre outros. Os fenómenos de corrupção são imensos e têm levado o dinheiro do Orçamento de Estado para um conjunto de grupos económicos e para os seus apaniguados. E, naturalmente, o dinheiro não estica e depois não chega para o que é essencial. Se, hoje, o Estado paga rentabilidades da ordem dos 20 por cento nas Parcerias Público Privadas, nomeadamente nas autoestradas ex-Scuts, é evidente que esse dinheiro devia estar a ser canalizado para reformas, para o Sistema Nacional de Saúde, para o ensino, para todo um conjunto de preocupações sociais que não são acompanhadas e cumpridas. Isto, porque o dinheiro vai para onde não deve ir.  E as pessoas sentem isso. No geral, além dessa preocupação apercebo-me já desde há dois anos que as pessoas estão receosas. Têm medo.

Medo do quê em concreto?

Têm medo do seu futuro, do futuro dos seus filhos que tiram um curso e ficam sem emprego, têm medo do futuro dos seus pais, cujas reformas já não chegam para pagar a mensalidade do lar de idosos, o que os obriga muitas vezes a retirá-los dessas instituições. As pessoas têm medo do desemprego, têm medo de estando empregadas chegarem ao final do mês e não receberem os seus salários. Há um ambiente geral de medo em Portugal. É claro que a corrupção com impunidade também gera o medo. Hoje no nosso país, numa repartição pública, numa câmara municipal, quem denuncie casos de maus gastos públicos, de corrupção, não só não é protegido como na melhor das hipóteses é ‘encostado’. Ou na pior das hipóteses, como acontece habitualmente, perseguido porque denunciou irregularidades. Os portugueses sentem uma imensa vontade de mudança. E é essa vontade de mudança que eu gostaria de protagonizar na Presidência da República.

Como funciona a sua estrutura da campanha? Quem o apoia e que ajudas ao nível económico tem recebido?

A minha estrutura de campanha é constituída por uma comissão política, que conta com um núcleo duro. Ou seja, um mandatário, a pessoa que tem sido responsável por todo o procedimento de recolha de assinaturas e sua entrega no Tribunal Constitucional, enfim todas as questões de representação da candidatura. Depois, há um mandatário financeiro, a que se juntam pessoas responsáveis pelo «online», pelo apoio à comunicação social, pela imagem geral da candidatura e pela logística. As responsabilidades estão devidamente distribuídas. Existem membros da comissão política que são apoiantes e que, nomeadamente, falam nas minhas reuniões, entre outras situações. No total, com voluntários conto com cerca duzentas pessoas envolvidas. O núcleo duro é constituído por sete, mais doze elementos, da minha inteira confiança, como não podia deixar confiança.

Qual o perfil dos seus apoiantes?

Temos gente de todas as idades. Há muitas pessoas já reformadas e como tal têm tempo livre para dar uma ajuda nesta campanha. Contamos, infelizmente, com alguns desempregados também com tempo livre e que têm expresso nesta candidatura a sua revolta. E temos alguns homens, que são, digamos, os mais animados em toda a campanha.

E qual é o orçamento?

É da ordem dos 200 mil euros. Entendo que seria muito negativo receber dinheiro de partidos, isso está fora de questão, assim como de quaisquer entidades coletivas, o que aliás é ilegal, ou até de pessoas associadas a grandes grupos económicos. Portanto, entendi que também no financiamento devemos democratizar e apelar à participação das pessoas. Por isso, iniciámos precisamente à meia-noite de 22 de outubro uma campanha cuja função é recolher donativos pequenos individuais, de cinco, dez, vinte, trinta euros. No máximo, de cem euros. O único donativo substancial muito para além dos cem euros é do próprio candidato. Tirando o meu contributo pessoal, o que quero são donativos pequenos, num apelo à participação das pessoas.

Pensa atingir os 200 mil euros do orçamento, ou receia ter prejuízo?

Prejuízo nunca haverá. Porque depois haverá uma dotação pública que será recebida após as eleições. Mas gostaria que uma parte muito substancial desse montante fosse conseguida com donativos de particulares. Os donativos que mais valorizo são os mais pequenos, de pessoas até sem grandes posses, mas que querem contribuir com dez, quinze, vinte euros para a minha campanha. Mas naturalmente se os donativos não forem suficientes para financiar toda a campanha, teremos a subvenção estatal.

Que tipo de campanha irá privilegiar – arruadas, ‘outdoors’, chapéus, sacos, isqueiros, esferográficas?…

Nada disso. Não vai haver arruadas, não vai haver almoços, não vai haver jantares, não vai haver vitela assada… Não vai haver canetas, sacos, não haverá «outdoors».

Haverá naturalmente material com a sua fotografia, ou também não?

Vai haver naturalmente a entrega de material gráfico às pessoas na rua. A campanha vai ser sóbria e valerá pelas suas ideias.

Não haverá ‘outdoors’ com a sua imagem por uma questão económica ou por opção sua?

Por várias razões. Nas campanhas eleitorais em países do Norte da Europa mais desenvolvidos, não vejo esse tipo de campanhas. Há muito mais moderação nesse tipo de gastos. Mas na fase em que Portugal está, com um milhão e 400 mil pessoas em situação de desemprego e subemprego, com muitas famílias a viverem na miséria em bairros sociais do Porto e de Lisboa, com a carência que há acho ofensivo, insultuoso, absolutamente chocante a quem está na política vir exibir esses sinais exteriores de riqueza.

Mas existem outros gastos?

Naturalmente. Há as deslocações do candidato e de quem o acompanha, despesas de alojamento.

Quantos quilómetros já percorreu?

Olhe, desde Maio dei três voltas ao país num contacto permanente com as pessoas, o que tem sido muito gratificante para mim. De Ponte de Lima a Albufeira, de Portimão à Covilhã, Belmonte, Lisboa e Porto, Setúbal, Évora e tantas outras cidades. Em outubro irei à Madeira e em novembro aos Açores.

As pessoas reconhecem-no na rua?

Sim, sim. Na rua, as pessoas vêm ter comigo.

Pedem-lhe autógrafos?

Pedem-me ‘selfies’, como está na moda. Já ninguém pede autógrafos.

E o que lhe dizem?

Muitas, sobretudo mais idosas, vêm manifestar-me as suas angústias. Estão muito receosas em Portugal e precisam de uma mudança que as faça acreditar no futuro. E há pessoas que me estimulam e me elogiam pela coragem.

Perante toda essa situação, vai mesmo até ao fim nesta sua candidatura a Presidente da República?

Nunca desistirei. Nunca! Isso está fora de questão. Desistir não faz parte da minha natureza. Mas o objetivo principal numa campanha presidencial é as pessoas defenderem as suas ideias e explicarem ao eleitorado o que farão no caso de ocuparem o lugar. Não vejo nenhum programa que de perto nem de longe se aproxime do meu. As outras candidaturas que se perfilam são partidárias, com o tipo de ligações que têm ao regime atual, muito envolvidas e próximas dos defeitos que o regime tem. A minha candidatura mais do que nunca faz todo o sentido em primeiro lugar pela minha própria personalidade. Jamais me teria candidatado se pensasse que poderia desistir. Também jamais me teria candidatado se achasse que não tinha qualquer possibilidade de ganhar. Não me estou a candidatar apenas para ser Presidente da República. Estou a candidatar-me para na função presidencial proceder às modificações que acho que a sociedade portuguesa necessita.

Acredita numa segunda volta?

Acredito.

Com quem acredita que poderá ir a uma segunda volta?

Não faço ideia, não sou comentador. Além disso, é muito cedo para sabermos. A mais de três meses é prematuro fazermos essa análise. De qualquer forma, não irei comentar sondagens sejam elas quais forem.

Há quem diga que com a candidatura de Marcelo Rebelo Sousa, Portugal já tem sucessor para o lugar de Cavaco Silva… O que pensa dos restantes candidatos, Maria de Belém, Sampaio da Nóvoa, Henrique Neto e mais recentemente Marisa Matias, do Bloco de Esquerda e Edgar Silva, do PCP?

A campanha eleitoral para mim não é uma campanha de popularidade televisiva ou de notoriedade. Não estou a concorrer para estrela de televisão. Estou a concorrer para Presidente da República. Estou e expor as minhas ideias ao eleitorado e espero que os outros candidatos façam o mesmo. Em qualquer debate, quero é discutir ideias e não quem tem a camisa mais bonita ou o penteado mais engraçado.  Só quero que os restantes candidatos digam ao que vêm. Isso é que é fundamental.

Será ou não um passeio para Marcelo Rebelo de Sousa?

Imagino que não. As pessoas dizem isso, mas sinceramente nem percebo porquê.

Qual a primeira medida que tomará se for eleito o próximo Presidente da República de Portugal?

A minha primeira ação será convocar o Parlamento para definir uma estratégia global de combate à corrupção. E é preciso uma unidade de missão para fazer uma análise sobre a legislação existente no nosso país. Há legislação absurda que é preciso rever ou acabar.

De que forma gostaria de exercer o cargo?

Quero ser um Presidente no terreno em toda a parte e não passar a maior parte do tempo no Palácio de Belém. Não é meu objetivo que a Presidência da República tenha de ser um símbolo monárquico com um palácio e primeira-dama. Comigo não haverá banquetes presidenciais, que introduzam promiscuidade entre políticos e banqueiros.

 

Quem é Paulo de Morais

Com 51 anos de idade, natural de Viana do Castelo e residente do Porto, Paulo de Morais, professor universitário, destaca a “persistência e a capacidade de resistência” como as suas principais virtudes, reconhecendo também por isso que a “teimosia” é o seu maior defeito. É adepto do Futebol Clube do Porto, gosta de ler “bons livros”, aprecia ópera e “música clássica com violino”, de que, aliás, se considera um amante. Já a nível gastronómico, enaltece os bolos de bacalhau do Alto Minho e o arroz de lingueirão à moda do Algarve. Costuma passar férias com a família em Portimão e em Monte Gordo.

 

 

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