“Temos de continuar, não podemos deixar parar a economia”
Texto: Ana Sofia Varela
A nível de turismo 2020 será um ano para esquecer e a palavra de ordem neste momento é a sobrevivência. Este é o alerta de Erik de Vlieger, empresário holandês proprietário do Carvoeiro Clube e que há vários anos decidiu apostar em concelhos como Lagoa e Portimão. No entanto, reforça que há um sentido de responsabilidade que tem de existir para manter a economia a funcionar.
Por isso, alerta que é necessário que a Câmara Municipal de Lagoa mantenha o Departamento Urbanístico a trabalhar, para agarrar o investimento privado, que fará a economia mexer. Aliás, esta é a mensagem que o empresário, que fez e tem previstos fortes investimentos no concelho, pretende passar. Para já, tomou a decisão de manter a obra do Atrium Lagoa, numa das principais entradas da cidade. E justifica que é por um sentimento de responsabilidade para com aqueles que dependem de si e para com a sociedade.
“Não podemos parar totalmente. O Carvoeiro Branco, a minha empresa que faz a promoção do Atrium Lagoa, é uma das mais importantes, porque, para ela, indiretamente, trabalham muitas pessoas”, justifica Erik de Vlieger.
“Falei com o construtor Simão Martins e concluímos que era melhor continuar. Aliás, era obrigatório. Eu não quero continuar, mas tenho de o fazer. É uma a responsabilidade, pois já muitas pessoas compraram os apartamentos, já liquidaram um sinal, o construtor já comprou os materiais para terminar a construção, como janelas ou cozinhas. Isto é uma cadeia que começa no Banco, passa por nós, pelo construtor, pelas empresas subcontratadas e pelos clientes que compraram. É difícil a nível logístico, mas tivemos de continuar”, revela ao Lagoa Informa.
Este é o sinal que o holandês, que se sente já um algarvio, quis dar à economia local. Admitiu que há mais projetos previstos para o concelho. “É uma situação nova e quando terminar é importante retomar de imediato o turismo e a construção. Por esta razão, digo à Câmara Municipal de Lagoa que é essencial que o Departamento Urbanístico tenha como grande responsabilidade ajudar as pessoas com iniciativa”, defende.
Esta é, porém, apenas uma das empresas pela qual Erik de Vlieger é responsável. Também integra a administração do Carvoeiro Clube e avança que, neste momento, passou dos 700 mil euros de faturação mensal para zero. Com sinceridade diz que está a viver ‘o inferno na terra’, porque é só uma “questão de defender e atacar, sem que nada de construtivo aconteça”, reforça.
“Estás em casa, vais deitar-te com dificuldade em dormir, pela situação que atravessas, e quando acordas só pensas neste problema”, exemplifica. É que, o Carvoeiro Clube tem oito resorts, o Carvoeiro Ténis e o Vale de Milho Golfe. Emprega 250 funcionários e, neste momento, teve de colocar 150 em ‘layoff’.
“Eu não quero continuar a obra do Atrium, mas tenho de continuar.
É uma responsabilidade. Isto é uma cadeia que começa no Banco,
passa por nós, pelo construtor, empresas subcontratadas e clientes”, diz Erik de Vlieger.
“Eu tenho uma responsabilidade. Para mim, Portugal, o Algarve são a minha casa e é um privilégio estar aqui enquanto investidor. A verdade é que lucrar é importante, mas este ano não. 2020 será apenas um ano para sobreviver. Não só para mim, como também para os meus empregados. E espero que em três ou quatro meses, possamos voltar” a retomar, assegura.
Uma opinião partilhada por Jeroen Haen, empresário da imobiliária Palm Lagoa, que reforça que a altura é apenas de “controlo de danos”. Isto porque, o Carvoeiro Clube, fundado em 1980 tem objetivos anuais de marketing, de estratégia, de crescimento, de qualidade, mas quando o COVID-19 entra nada mais interessa senão sobreviver”, comenta.
“Ser responsável, primeiro para com os empregados, para com as famílias que trabalham há muitos anos connosco, depois com os fornecedores, cumprindo os contratos, pagando. O Carvoeiro Clube não é uma empresa que dirá ‘É pena, não pagamos’. Temos de continuar, mas agora é só proteger o coração, porque o resto não importa”, conclui.
Ambos concordam ainda que a nível turístico, 2020 não será um ano para investimentos em novas construções de resort, mas de habitação para os portugueses e para fixar pessoas no concelho.
“Quando esta situação terminar começa uma nova vida. Por esta
razão, digo à Câmara de Lagoa que é muito importante ajudar as pessoas com iniciativa”, defende Erik de Vlieger.
Algarve é seguro
“Eu não sinto medo”, diz sem hesitar Erik de Vlieger ao Lagoa Informa. “Dou graças a Deus por viver cá”, reforça. E quando lhe perguntam “como está o Algarve?” responde que basta olhar para os números. “A região tem 260 infeções e oito mortos (números à data desta entrevista). É fenomenal e posso dizer que a disciplina que vejo cá é algo de único. Na Holanda, as pessoas andam no parque, andam de bicicleta”, descreve.
Também o empresário da Palm Lagoa afirma não ter medo no que diz respeito a ter a doença, mas sente receio se, caso a tiver, haver a possibilidade de infetar um amigo, um vizinho. “Sinto-me muito seguro no Algarve. 150 por cento! Estamos tão impressionados com os algarvios. Parte da minha família, pais e irmão, estão na Holanda e lá continuam a organizar barbecues ou a brincar no parque. Os portugueses têm sido inteligentes e muito responsáveis.Merecem todos os elogios e é por isso que serão recompensados no futuro”, acredita Jeroen.
Medidas do governo positivas
Ambos os empresários, que antes de mais são residentes no Algarve, veem com bons olhos as linhas de crédito lançadas pelo Governo para ajudar as empresas, mas também as restantes medidas que permitem que os trabalhadores possam ter rendimentos em regime de ‘layoff’ ou que os pagamentos de empréstimos possam ser adiados seis meses. “São medidas muito boas, eu não tenho queixas, se comparar com outros países. Na Holanda é necessário pagar tudo na mesma”, exemplifica Erik de Vlieger. Uma opinião partilhada por Jeroen Haen que acredita que “o primeiro ministro António Costa assumiu as suas responsabilidades”.
Imobiliária em queda
Jeroen Haen, responsável pela imobiliária Palm Lagoa, sediada em Carvoeiro, diz que o segmento de compra e venda de imóveis está muito fraco. Tem esperança que, após a pandemia, o setor retome, mas refere que o grande impulsionador desse regresso à normalidade será também a aposta na reabilitação urbana, até porque, do ponto de vista do empresário, esse é o grande “motor da economia”. Defende, tal como Erik de Vlieger, que o futuro a curto prazo deverá passar pela aposta na construção de casas para os portugueses, para arrendamento, para os trabalhadores locais e juventude.
Responsabilidade social
Quando a pandemia chegou ao Algarve, os empresários holandeses sentaram-se à mesa para encontrar formas de ajudar. “Pensámos no que podíamos fazer no imediato. Não temos um hospital para ceder, mas temos fantásticos resorts, que as pessoas e os profissionais de saúde podem utilizar”, justificou Jeroen Haen.
“Para mim, o Algarve é a minha casa e é um privilégio estar aqui enquanto investidor. Lucrar é importante, mas este ano não. 2020 trata-se apenas de sobreviver”, afirma Erik de Vlieger.
O Carvoeiro Clube foi o primeiro a disponibilizar o espaço para receber enfermeiros, médicos ou outros profissionais de saúde que precisem de se isolar das famílias para evitar uma eventual contaminação. O empresário revela que houve interesse e que alguns espaços estão a ser ocupados.
O grande erro da Holanda
“A Holanda está a cometer um grande erro. Lá estão noutra direção, que é a imunidade de grupo. Para mim, pessoalmente é difícil, porque tenho duas filhas a trabalhar na Holanda e as outras duas estão cá. É contranatura estar afastado delas, mas vamos falando por ‘Facetime’”, admite Erik de Vlieger. Já Jeroen não tem receio de dizer que no seu país estão a ser ingénuos.
“Normalmente temos orgulho do nosso país, mas neste momento não. Falei com o meu pai há três semanas e perguntei-lhe o que ia fazer. Ele disse-me que iria ajudar na Igreja no dia seguinte. Eu disse-lhe para ficar em casa, pois podia infetar os netos, a esposa ou ele próprio e expliquei-lhe que esta é uma doença grave”, afirma o empresário imobiliário.
“Sinto-me muito seguro cá. 150 por cento! Estamos tão impressionados com os algarvios. A minha família, pais e irmão estão na Holanda e lá continuam a organizar barbecues ou a brincar no parque. Os portugueses são tão inteligentes e responsáveis”, descreve Jeroen Haen.
Médicos e enfermeiros são heróis, mas professores também
Jeroen Haen, responsável pela imobiliária Palm Lagoa, sediada em Carvoeiro, tem dois filhos a frequentar o ensino primário numa escola local. E pela sua experiência pessoal, não poupa elogios aos profissionais que vão garantindo a educação das crianças. “Os heróis são os enfermeiros e médicos, mas, na minha opinião, os professores são os segundos heróis. Eles estão cheios de trabalho, têm uma missão extra e recebem pouco”, começa por dizer. Da sua experiência enquanto pai, mas também do feedback que tem dos seus colaboradores com filhos noutras escolas, o cenário é igual. “Numa altura normal, eles têm 25 alunos numa sala e vão lecionado. Agora têm que telefonar, enviar email, esclarecer e estão cansados”, conta o empresário. “Estou grato e pensei no que poderia fazer para ajudar. Então criei um grupo de WhatsApp com todos os pais da sala dos meus filhos, onde os professores podem ver o que os alunos fazem em casa e para que haja interatividade entre as crianças, porque a relação social, nesta altura, não existe”, explica. Aliás, o empresário considera que é necessário abrir as escolas, para dar também um sinal de normalidade, defendendo um conjunto de procedimentos que evitem a propagação do vírus.
Medidas futuras
Apesar de todas as contrariedades que o novo coronavírus COVID-19 tem provocado, é necessário que quando a acalmia chegar, sejam tomadas medidas para controlar um novo contágio, sem colocar em risco a economia ou sobrecarregar os serviços existentes. Numa perspetiva económica Jeroen Haen, considera que é necessário precaver e encontrar novas oportunidades. “O aeroporto deveria abrir, mas com segurança. Investir, talvez com dinheiro de todos os municípios do Algarve, na contratação de mais pessoas, indo buscar aquelas que vivem do turismo e que vão ficar desempregadas, para coloca-las a testar os passageiros que chegam, a febre, saber se têm sintomas como tosse. Se sim, seriam obrigados a apanhar um voo de regresso ao seu país”, argumenta.
A pandemia que está agora a assolar o país deveria ser também um incentivo para investir na saúde no Algarve. “O meu maior medo é acabar num hospital público. Eu sou estrangeiro, conheço o sistema de saúde do meu país e é muito diferente”, diz. “Um hospital na Holanda é como um hotel de cinco estrelas”, compara Erik de Vlieger. E há mais vantagens em investir no Algarve. “Em comparação com qualquer grande cidade europeia, o Algarve tem pessoas fantásticas, ar puro, bom ambiente, não tem poluição, nem grandes indústrias químicas”, enumera o responsável da Palm Lagoa. Não entende também porque a maioria dos serviços estão centralizados em Lisboa, quando o Algarve tem boas condições para trabalhar e ter essas infraestruturas.