Portimonense Arlete Silva, uma ‘lufada centenária’ de ar fresco

Texto e foto: José Garrancho


A simpática idosa Arlete Silva cumpriu o 102º aniversário, no dia 3 de janeiro, e soprou com força as velas do seu bolo de aniversário, no Centro de Dia do Lar Diogo Gonçalves.

Se chegar a esta idade é um feito reservado a poucos, no caso de Arlete Silva é acentuado pelo facto de se deslocar apenas com a ajuda de uma bengala, efetuar a higiene pessoal sem ajuda, ler sem necessidade de óculos e ter uma excelente capacidade de diálogo, só dificultada pela audição já um pouco deficiente.

“À noite, vou para casa. Vivo com a minha filha e o meu genro, que é muito meu amigo. Vou para o meu quarto, visto o pijama, leio um bocadinho e, depois, deito-me. A minha companhia é a gata, que vem logo para junto de mim. Deus é meu amigo, porque nunca peço nada para mim; peço sempre para todos”, foi dizendo esta senhora que nasceu em Ferreira do Zêzere, andou por Angola e tem uma filha e um filho, netos, bisnetos e trinetos. A mãe teve oito filhos, seis raparigas e dois rapazes. Estes, os mais novos, ainda estão vivos. Ela é a única rapariga que resta.

Trabalhou antes de frequentar a escola
“O meu avô, a quem chamavam ‘Colha Colha’, tinha uma quinta. Fui viver com ele, tinha seis anos, e comecei a guardar ovelhas, a apanhar erva para os coelhos e a levar água para casa. As pessoas chamavam-nos ‘formiguinhas’. Depois, fui viver com a minha avó e comecei a ir à escola. Mas só completei a quarta classe depois de crescida, para tirar a carta de condução”, recorda em conversa com o Portimão Jornal.

Viveu em Angola, com o marido, no Lobito e em Benguela
Com lucidez, relembra outros episódios da sua vida. “Tinha uma horta, onde também criava galinhas. Havia uma senhora com problemas de tuberculose e eu dava-lhe sempre uma dúzia de ovos. Não sou avarenta. Quando tenho, dou. Se não tenho, não posso dar”, admite.

Conta que veio de Angola, após a independência, tendo vivido no Lobito e em Benguela, e que o marido era muito bom para si, acrescentando que foi pena ter falecido, há mais de 50 anos. Sente a sua falta. “Mas a minha neta é muito minha amiga. Dá-me tudo. O meu neto também é, mas ela é mais”, confessa.

Idade avançada é herança
“A minha avó durou até aos 115 anos. Não tinha uma perna, mas usava um aparelho e fazia de tudo. Tinha uma taberna, na vila. Sentavam-na numa cadeira e ia de burro. Trabalhava todo o dia na taberna e, à noite, regressava a casa. Cozinhava, fazia pão, tudo com o aparelho. Agora, com as cadeiras de rodas, não podem fazer nada. Os aparelhos eram melhores”, vai desabafando Arlete Silva, que espera alcançar a idade a que a avó chegou.

“Cem anos mais dois não são brincadeira nenhuma”

Sobre o Centro de Dia do Lar Diogo Gonçalves, é perentória em afirmar: “Gosto de estar aqui. Elas tratam-me bem. Às vezes, zangam-se comigo, mas podem dizer o que quiserem que a minha boca não se abre. Aprendi com a minha mãe, que dizia ‘o calado comeu tudo e não pagou nada’”, adianta ainda. Quando era mais nova, fazia crochet que oferecia a todos. “Agora, já não posso fazer. Também, cem anos mais dois não são brincadeira nenhuma”, conclui com satisfação.

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