Opinião: ‘Achado não é roubado?’ Saiba o que estabelece a lei portuguesa

Raquel Torres | Advogada
raqueltorres.adv@gmail.com


Diz o velho ditado que “achado não é roubado”. E de facto não é. No entanto, saiba que a lei portuguesa protege a propriedade alheia que seja esquecida ou perdida pelo seu dono.

Todos, em algum momento das nossas vidas, já encontrámos uma moeda, uma nota ou outro bem perdido ou esquecido pelo seu dono, na rua ou em qualquer outro local.

Nestes casos, deve sempre tentar verificar se existe uma forma de identificar o dono e proceder à restituição do bem encontrado, ou, no caso do dinheiro, tentar perceber a quem pertence.

Mas se tal não for possível, então saiba que está obrigado a entregar os bens que possa encontrar à secção dos perdidos e achados, se esta existir (no caso dos centros comerciais, transportes públicos, serviços públicos, espaços culturais, entre outros, …), ou às autoridades (PSP e GNR).

Caso contrário, poderá mesmo incorrer em responsabilidade criminal, designadamente na prática de um crime de apropriação ilegítima, previsto no artigo 209.º do Código Penal, punível com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias, caso a pessoa que perdeu o bem venha a apresentar queixa e seja instaurado procedimento criminal.

No entanto, cumpre sublinhar que para estarmos perante a prática do referido crime, é necessário que exista por parte de quem encontrou o bem esquecido ou perdido, um “manifesto acto de apropriação”, comportando-se como se aquele bem fosse efetivamente seu, para que o crime seja consumado.

Desse modo, não preenche o tipo legal do crime qualquer mera omissão de entrega, é o caso daquele que conserva a coisa à espera que a mesma seja reclamada, na medida em que não se comporta como um verdadeiro proprietário.

Mas se se conformar com o resultado, isto é, desinteressando-se se viola ou não a propriedade alheia, retendo e usando o bem encontrado, então saiba que tal pode configurar a prática do referido crime.

Para além da tutela penal, as coisas perdidas beneficiam ainda de tutela cível, por força do disposto no artigo 1323.º do Código Civil, que estabelece que aquele que achar coisa perdida deve restituí-la ao seu dono, se souber a quem pertence, ou, caso não saiba, comunicar o seu achado às autoridades.

Assim, da próxima vez que encontrar dinheiro ou qualquer outro bem, perdido ou esquecido na rua ou em qualquer outro local, lembre-se que nem sempre os velhos ditados espelham a lei em vigor. E se achado não é efetivamente roubado, já a apropriação de bens alheios perdidos ou esquecidos pelo seu dono, pode configurar a prática de um crime e fazê-lo incorrer em responsabilidade criminal e cível.

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