Pedra Mourinha de ‘cara lavada’ recupera mística e credibilidade

Texto: Hélio Nascimento | Fotos: Eduardo Jacinto, in Portimão Jornal nº38


Fundado em 1983, o Clube Desportivo Recreativo da Pedra Mourinha é uma referência na cidade e um exemplo típico de coletividade que procura agregar os seus associados e desenvolver uma ação desportiva, cultural e social na tentativa de valorizar o meio em que se insere.

Os primeiros passos foram auspiciosos e levaram a um crescimento rápido, com a prestimosa ajuda, precisamente, dos sócios. As infraestruturas criadas são disso o melhor exemplo, abarcando o pavilhão, o amplo bar e um salão onde decorrem os espetáculos e outros eventos.

Porém, nem tudo tem sido perfeito na vida do clube, que há cerca de um mês elegeu nova Direção. Jorge Águas, vice-presidente e responsável pela vertente desportiva, recebeu a reportagem de Portimão Jornal e foi explícito no comentário.

“Não digo que o Pedra Mourinha tenha parado no tempo, mas falta-lhe um ‘upgrade’ para voltar aos períodos mais áureos. Entrou agora uma nova direção, que está determinada em concretizar essa ideia, fazer coisas bonitas e dar o salto. Vamos proceder a um forte investimento nas infraestruturas e também no futsal, dos benjamins aos seniores. É esse o caminho, sempre com trabalho, dedicação e foco no associativismo”.

Quem não conhece as instalações – próprias – do Pedra Mourinha pode até ficar admirado, porque são espaçosas, funcionais e agradáveis. A conversa decorre no pavilhão, onde vão treinando as equipas de futsal, a modalidade rainha da coletividade, e Jorge Águas, confrontado com o facto de dispor destas excelentes condições, sorri, confirma e adianta algo mais.

“Fui praticante da modalidade e digo, com sinceridade, que a nível nacional poucos clubes de bairro têm estas infraestruturas. Só que em alguns locais estão um pouco degradadas, nomeadamente em termos de balneários, de alguns corredores e das paredes, que precisam de ser pintadas. São os tais aspetos que foram sendo abandonados e que têm de ser melhorados a curto prazo”

Atletas da formação têm de regressar
Antes dos resultados e das vitórias, garante o dirigente, “é preciso criar condições para que possamos evoluir”. A Direção está consciente disso e acredita que o “efeito bola de neve” vai ajudar ao progresso, não só nas modalidades (futsal, karaté, zumba, setas e krav maga) como também no dia a dia do Pedra Mourinha.

“O futsal foi criado por um sócio carismático, o Xico Diogo. Foi ele o impulsionador, mas, com o passar do tempo, a modalidade perdeu alguma credibilidade. Muitos dos nossos jogadores, que tinham sido aqui formados, espalharam-se por emblemas das redondezas. Nós queremos fazê-los regressar”, promete Jorge Águas, referindo que alguns deles atuam no Lagoa e no Gejupce.

“Só temos no plantel um jogador da formação, do passado recente, mas desejamos que os outros voltem e vamos, igualmente, apostar mais nos elementos da casa”. 

Se há alguém com autoridade para falar do futsal do Pedra Mourinha, é mesmo Jorge Águas. “Comecei a representar o clube com sete ou oito anos, participando em torneios. Já como infantil passei para o futebol de onze e joguei no Portimonense, até aos seniores. Voltei de novo ao futsal, andei por outros clubes, mas sou Pedra Mourinha e não podia virar as costas. Há cerca de cinco anos regressei, ainda como jogador, visando um projeto que depois não vingou. A seguir houve a hipótese de continuar a ajudar, como diretor desportivo, e agora integro a nova direção, cujo presidente é o Miguel Ângelo”, destaca Águas, que trabalha em hotelaria, no grupo Tivoli, e tem 38 anos.

Fundamental transmitir uma boa imagem
“Quem passa por este clube, e já centenas de atletas passaram, fica com um sentimento especial. Todos são bem tratados e a amizade é uma constante. Ganha-se a mística da Pedra Mourinha, que se perdeu, e é isso que queremos recuperar a todo o custo”, enfatiza o ‘vice’ e responsável pela área desportiva.

A coletividade tem cerca de 80 jogadores, divididos por cinco equipas, as de benjamins, infantis, iniciados, juniores (incluindo miúdos com idade de juvenil) e seniores, que disputam a I Divisão Distrital.

“O nosso objetivo passa por ganhar credibilidade, e, dentro do amadorismo, sermos o mais profissionais possível. Por isso, conseguimos ir buscar um treinador que tem experiência de I Divisão Nacional. Antes dos resultados, que também são importantes, queremos passar a mensagem de que trabalhamos bem. Depois, então sim, poderemos pensar na subida num futuro breve”.

Jorge Águas reforça esta ideia: “A perspetiva é sempre a de ter bons resultados, mas estamos preparados para tudo. Fundamental é transmitir uma boa imagem e que estamos empenhados nisto, trabalhando a sério e com persistência. Se assim for, os resultados positivos aparecerão”.

O futsal conta com dez técnicos e é “tudo por carolice”, mas “queremos que não lhes falte nada e damos todo o apoio”, remata o dirigente, um dos sete que compõem a nova direção.

“Até podemos treinar às três da manhã”
A principal fonte de receitas do Pedra Mourinha é o bar, destacando-se, ainda, a realização de vários eventos, tipo concertos musicais, festas e, muito brevemente, noites de fado. Num universo de cerca de mil sócios, apenas um quarto paga as suas quotas, pelo que “importa que o associativismo volte a crescer”.

A Câmara Municipal de Portimão dá apoio e a iluminação LED de que o clube dispõe, num investimento da anterior Direção, que teve o cunho do município. De resto, “temos consciência de que há mais clubes na região e sabemos que a vida não está fácil para as autarquias”.

Por falar em clubes, e embora o concelho tenha muitos e bons, “nós, aqui, não temos muita dificuldade em captar miúdos, já que a dimensão das instalações e as condições oferecidas levam muitos pais a trazerem os filhos”, argumenta Jorge Águas.

O facto de o Pedra Mourinha ter instalações próprias vem de novo à baila, com o dirigente a lembrar que “até o Portimonense, por exemplo, está mais limitado, uma vez que tem de treinar num pavilhão da autarquia”. E prosseguindo: “Estamos menos organizados, é verdade, mas, se corrigirmos este aspeto, como queremos e vamos conseguir, muito dificilmente os clubes à nossa volta farão melhor. Até podemos treinar às três da manhã”, graceja, sendo que o espaço do pavilhão é destinado ao futsal e os eventos decorrem no salão, na parte superior da sede.

Uma última nota para o futsal algarvio, com Jorge Águas a considerar que ainda “há bastante a melhorar”, apesar de ao longo destes últimos anos, “e digo-o com orgulho, o Pedro Moreira ter impulsionado a modalidade de modo fantástico”.

O treinador do Portimonense e figura carismática da cidade, garante Águas, “mexeu com o futsal de Sagres a Vila Real de Santo António, divulgando e mostrando o caminho, que, aliás, muitas equipas, hoje, copiam e seguem”.

Um presidente com veia cultural
Miguel Ângelo, o presidente do Pedra Mourinha acompanhou a parte final da nossa reportagem e prontificou-se a acrescentar mais alguns pormenores, em especial sobre a vertente cultural. “A grande ideia é levar o clube a bom porto. A direção é composta por gente nova e dispomos de condições e infraestruturas que justificam que a instituição seja bem falada e reconhecida, tanto do ponto de vista desportivo como cultural, o que é importante para a cidade”.

O novo líder, que frequenta o clube há cerca de 25 anos, acompanhou de perto o seu crescimento e jogou futsal. Dedicou-se, depois, a outras artes. “Venho da parte cultural. Fiz teatro na Mexilhoeira e no Boa Esperança, uma grande escola, e, agora, estou cá de novo. Sim, tenho a ambição de trazer o teatro para o Pedra Mourinha. Para já temos marcados diversos eventos, praticamente até março, e quero ver se trazemos o Marginália”, revela este jovem de 30 anos, vendedor na Delta. “A sede, o pavilhão, todo este espaço é nosso. Isso é muito bom e vamos aproveitar, com trabalho, dedicação e projetos novos”.


Duas vozes do futsal

Sandro Borges, o grande resistente

Kutxó é a alcunha de Sandro Borges, de 34 anos, um pivô que joga desde 2001 no Pedra Mourinha. “Estive sempre aqui, a casa é boa, não há melhor no Algarve… Tive outros convites de clubes aqui da zona, mas sou fiel ao emblema”, diz o jogador, satisfeito por esta longa ligação. “Sou o mais velho, talvez uma referência, e procuro transmitir o que tenho aprendido. Já passei por bons e maus momentos e espero conquistar mais títulos e jogar mais um ou dois anos. Força? A gente tenta ir buscar, mas já não é a mesma coisa”, reconhece Sandro, que nasceu em Lisboa e veio para Portimão ainda pequeno. Os seus ídolos são o incontornável Ricardinho e Pany Varela.

Alcides Catarino, o técnico de optometria

“Isto é uma paixão”, garante Alcides Catarino, praticante “toda a vida” de futebol e futsal, sobretudo em clubes de Lagos, e hoje adjunto. “Tirei o curso de treinadores e estive sempre ligado à modalidade. O Pedra Mourinha convidou-me, gostei e estou cá sempre, porque quem corre por gosto…”, conta este técnico de optometria. Alcides sublinha que a escolha de Nuno Duarte para treinador resultou em cheio. “Está bem entregue e é deixar trabalhar, porque isto demora tempo, mas os resultados vão aparecer. Os jogadores do ano passado transcendem-se, já deu para ver. Temos todas as condições e dispor de casa própria é uma grande vantagem e um conforto”.


“Estou entre gente humilde e o projeto convenceu-me”

Nuno Duarte, o atual responsável técnico da equipa de futsal, tem um largo historial na modalidade, desde os tempos de jogador. Iniciou-se nos Leões de Porto Salvo, passou pelo Belenenses e voltou à casa de partida, então já como treinador, dos juniores e dos seniores, tendo também sido adjunto.
“É uma longa caminhada, com coisas boas”, conta à nossa reportagem, explicando o ingresso no Pedra Mourinha. “Tive uma proposta para vir trabalhar para o Algarve, como gestor de clientes de uma firma de limpeza, que é a minha área, e, como é uma região de que gosto e à qual até tenho ligações, cá estou”.

No ano passado dirigiu os sub-20 do Portimonense, mas a pandemia atrapalhou os planos. “O Nuno, anterior presidente do Pedra Mourinha, desafiou-me este ano e no dia 23 de agosto começámos”. Mas como é que um treinador habituado a trabalhar na I Divisão nacional surge agora num campeonato distrital? “Vi que estou entre gente humilde e o projeto convenceu-me. O clube, com as condições que tem, é uma pena estar neste escalão, mas sou ambicioso por natureza e quero mais”.

Nuno Duarte reconhece que os resultados ainda não são os desejados, prometendo, porém, que a imagem vai melhorar. “Nada me exigiram. Já há alguma qualidade, e, embora me possam chamar otimista, acredito que vamos acabar nos três primeiros lugares”, atira, voltando a elogiar as condições de trabalho e lembrando que tem um plantel totalmente amador. “Os jogadores ganham uma bifana se os dirigentes estão bem-dispostos”, sublinha, com graça. “Vamos criar laços entre os miúdos e os seniores, em que toda a gente se cumprimenta e marca presença nos jogos dos outros. O Pedra Mourinha vai crescer muito! Há amor ao clube e é gente da terra”.

A terminar, o treinador deixou algumas críticas à Associação do Algarve, acusando-a de não estar a acompanhar a evolução da modalidade, ao mesmo tempo que lamenta o facto de nenhuma equipa de formação da província disputar os Nacionais. “Temos o Portimonense em foco com os seniores, mas aí a obra é do Pedro Moreira”.

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