Restaurante ‘Zizá’ em Portimão tem 47 anos mas a aventura começou em 1969

Texto e fotos: José Garrancho


Comecei a fazer as contas às mesas, no ‘Bom Apetite’, aos dez anos. Não havia registadoras, nesse tempo”. Assim começou Isilda Francisco a sua já longa história na restauração. Os seus pais, António José e Teresa, ainda hoje recordados com saudade por muitos portimonenses seniores, tomaram de trespasse o ‘Bom Apetite’, em 1969, no rés-do-chão do edifício onde estava instalada a delegação da Secretaria de Estado das Pescas, em frente ao atual restaurante, o ‘Zizá’.

“Era uma taberna, onde os marítimos também guardavam as bicicletas, quando iam para o mar. Havia uns pescadores de Tavira, que traziam peixe para a minha mãe lhes fazer a caldeirada. Vinham sempre dois baldes. Um para a sua alimentação e o outro para a minha mãe cozinhar e servir aos restantes clientes”, foi dizendo. Um senhor, chamado Américo, amanhava o peixe na rua. E o senhor ‘Tóino Zé’ chegava a comprar meias vitelas, que desmanchava e grelhava para os clientes, sobretudo vendedores, os caixeiros-viajantes de então. Assim se transformou a taberna em casa de pasto, como era costume na época.

“Após o 25 de Abril, o meu pai comprou a casa em frente, demoliu-a e fez o restaurante ‘Zizá’. Quando quis abri-lo, em 1977, tinha eu 16 anos, surgiram problemas de saúde, deixei de ir à escola e fiquei a ajudar a família”, recorda.

O pai grelhava o peixe, a mãe cozinhava e Isilda Francisco ajudava nas mesas, enquanto aprendia também a confecionar os deliciosos pitéus com que, ainda hoje, atrai e cativa a clientela.

“Fomos trabalhando e eu fui-me adaptando. Depois, acabei por ficar responsável pela casa, em 2004, quando começou a faltar a saúde aos meus pais. Faço as compras, cozinho e vou às mesas, num estabelecimento com 42 lugares. Tenho duas ajudantes na cozinha e um empregado de mesa”.

A melhor cataplana do Algarve
Além do peixe grelhado, obrigatório em qualquer restaurante algarvio, no ‘Zizá’ há vários outros pratos típicos, como arroz de polvo ou de lingueirão, massada de peixe, lulinhas fritas, carapaus alimados e, como não podia deixar de ser, as diversas cataplanas: peixe e marisco, polvo com batata-doce, bacalhau e marisco, ou carne.

Aliás, em 2015, no concurso nacional de gastronomia organizado pela Coca-Cola, foi premiado como o restaurante com a melhor cataplana algarvia.
A partir desse momento, ganhou uma nova clientela, os turistas. Os clientes habituais continuam, em especial aos almoços. Os visitantes preferem os jantares, para degustar as especialidades.

“Vêm pela cataplana, mas depois regressam para provar os outros. Os espanhóis adoram o arroz, de polvo e de lingueirão”, garante Isilda Francisco. “Mas aconselho que façam reserva para a cataplana, cuja confeção demora cerca de 40 minutos, para não ficarem muito tempo à espera, na mesa. Não me peçam cataplana para sair em dez minutos, porque é impossível fazer”.

“Ou é fresco, ou não tenho”
“As pessoas vêm, porque sabem que a comida é fresca. Ou é fresco, ou não tenho. Repare, por exemplo, nas sardinhas, que só vão ser pescadas a partir do início de maio. Sei que há quem venda sardinhas congeladas grelhadas, mas eu não tenho. Até podem ser boas, mas não trabalho com congelados. Comam carapaus, que estão bons e, se não vender todos, alimo”, explica.

E há quem reclame, sem saber bem porquê. “Uma cliente pediu lulas frescas grelhadas e, quando as mesmas chegaram, chamou-me à mesa, dizendo que não as podia comer, porque não estavam limpas. Respondi-lhe que nunca se tira as ovas e o barquilho às lulas frescas para grelhar, ao que me disse que sempre tinha comido as lulas brancas, limpinhas, ou seja, nunca tinha provado lulas frescas”, recorda. E também há clientes a reclamar das batatas fritas, porque são caseiras e estão habituados às congeladas.

‘Miminhos’ também são usuais nesta casa, tanto que Isilda Francisco, volta e meia, leva um pratinho de papas de caldo, como oferta de entrada. Há pessoas que nunca provaram e desconhecem. “Perguntam-me o que é, explico, provam, uns gostam e outros não. Na vez seguinte, alguns já pedem as papas”.

O mesmo acontece com a feijoada, que oferece, quando a tem pronta. “Por exemplo, os estrangeiros não sabem o que são carapaus alimados. Se lhes oferecer um carapau temperado com azeite e um alhinho por cima, provam e ficam encantados. E, no futuro, vão pedir. E os restaurantes grandes não fazem isso”.

Fim anunciado
Por razões de saúde, Isilda Francisco terá de reduzir o horário de funcionamento da cozinha, que encerrará às 14h30 ao almoço e às 22h00 ao jantar. “A minha perspetiva é para mais três ou quatro anos e, depois, parar. Como nem os meus filhos, nem os meus sobrinhos, mostram qualquer interesse nesta atividade, possivelmente será mais um restaurante tradicional a encerrar as portas”, confidencia ainda ao Portimão Jornal. Para já, continua aberto no número 18 da Rua Júdice Fialho, podendo os interessados efetuar reserva por telefone (966 828 566).

Cataplanas tradicionais
A mãe Teresa começou por cozinhar caldeiradas, depois vieram as lulinhas fritas, mais tarde, a moreia e, por fim, as cataplanas. “As primeiras cataplanas que se serviram no Algarve eram de carne de porco com amêijoas e colocavam alguns camarões, coentros e pimentos para enfeitar”, explicou Isilda Francisco. “Agora é que se faz de qualquer coisa”.

“Restauração é trabalho para gente maluca”
“Sabemos quando entramos, mas nunca quando saímos. Depois, os empregados, se trabalham oito ou dez horas, queixam-se que estão a trabalhar demais. Esquecem-se de que faço 14 ou 16 horas, para manter o trabalho deles. Vou comprar peixe e marisco, todos os dias, porque não uso congelados e esses produtos não aguentam mais do que dois ou três dias. E as pessoas vêm, porque sabem que a comida é fresca”.
 
Clientela fiel
Quando os empresários locais dedicados aos turistas se queixam de que o ano está a começar mal, Isilda Francisco diz que não tem problemas. A clientela local mantém-se fiel e os turistas continuam a procurar o seu estabelecimento. A proprietária afirma ter trabalhado muito bem com espanhóis na Páscoa.

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