Stanislav: “O que eu mais quero fazer é reinar, combater e ganhar”
Texto: Hélio Nascimento
Stanislav Yoltukhovskiy tem nome ucraniano, mas é portimonense de gema e foi a representar Portugal que conquistou a medalha de bronze na Taça da Europa de cadetes, dando assim sequência a duas semanas de sucesso, uma vez que dias antes sagrara-se campeão nacional de cadetes com as cores do Judo Clube de Portimão (JCP). O jovem de 16 anos, no entanto, não foi o único a subir ao lugar mais alto do pódio na prova realizada em Almada, em 10 e 11 de fevereiro, já que a sua colega Beatriz Rosa conseguiu idêntica proeza, arrebatando o título nacional na categoria de menos de 70 quilos.
Stass, como é conhecido no meio da modalidade, compete em menos de 90 quilos, é cadete de terceiro ano e pratica judo desde os quatro anos, sempre no JCP. Nasceu e reside em Portimão, com os pais, que são ucranianos e estão por cá radicados há mais de duas décadas. “Ainda tenho família na Ucrânia, bisavós e um tio, e já fui visitá-los. Não é fácil ouvir as notícias sobre a guerra e ter familiares a viver a situação, mas, dentro do possível, estão mais ou menos bem”, diz o também estudante (11º ano) de Ciências e Tecnologias, que ainda se aventurou na natação e no boxe até se dedicar apenas ao judo.
No Nacional de Cadetes, Stanislav terá alcançado “a vitória mais saborosa” da sua carreira, mas apressa-se a dizer que já teve “combates mais difíceis”. Todavia, “não quero dizer que estes tivessem sido fáceis, sobretudo porque ganhar um Nacional é sempre bom e o sabor do triunfo é incrível”, realça, aludindo às cinco vitórias registadas na prova e comparando com outras medalhas anteriormente ganhas.
A reportagem do Portimão Jornal juntou ainda à conversa duas judocas, Beatriz Rosa e Maria Nobre, ambas figuras de proa do Judo Clube de Portimão, onde decorre a conversa. Beatriz é cadete de segundo ano, compete em menos de 70 quilos, tem 15 anos e começou aos cinco, no Alvor. “Fiz uma paragem, por altura da pandemia, e depois ingressei no JCP”, diz a cinturão castanho. Maria, por seu turno, tem 16 anos, treina desde os cinco, sempre no clube, compete em menos de 52 quilos, é cadete de terceiro ano e cinto negro.
Orgulho de representar a Seleção
A Taça da Europa, que decorreu em Fuengirola (Espanha), em 17 e 18 de fevereiro, é naturalmente um marco para Stanislav. “É de nível acima e é também o passar de uma medalha nacional para internacional. Subi de categoria, implica mais esforço físico, mas foi tremendo, inclusive pelo facto de ser desafiante defrontar adversários mais fortes”. E representar a Seleção é “algo de especial”, embora o atleta já há tempo que defenda as cores nacionais.
“Até agora este foi o melhor momento, mas espero ter muitos outros. A este nível diria que as pessoas estão mais focadas, mais sólidas e os combates são cada vez mais difíceis, mas a medalha trouxe-me propostas pessoais para melhorar no próximo torneio e fazer ainda melhor figura”. Em Fuengirola, Stass ganhou o primeiro combate, perdeu o segundo, foi repescado e só parou com o bronze ao peito.
Beatriz também foi à Taça da Europa, mas não correu tão bem como no ano passado, em que obteve o sétimo lugar. “Depende um pouco do sorteio e este ano perdi o primeiro combate e não fui repescada”. De resto, é sempre bom representar Portugal, graças a um espírito de forte união, em que “os treinadores puxam por nós e querem que todos aproveitem a ocasião”. Há vários estágios de seleção durante todo o ano e os últimos têm sido no Jamor, em Lisboa.
A judoca portimonense, como já se disse, foi campeã nacional de cadetes, o que constituiu “uma surpresa”, porque cumpre a segunda época no escalão e apanhou adversárias mais velhas. “Não estava à espera, mas, claro, gostei imenso. Acho que foi a minha vitória mais saborosa”, reconhece Beatriz, que estuda Ciências e Tecnologias.
Um abraço rumo à medalha
Maria Nobre ganhou a medalha de bronze no Nacional de Cadetes, e, como ela diz, “também é qualquer coisa”. Frequenta igualmente o curso de Ciências e Tecnologias e vinca que “podia ter sido melhor, mas tive uma quebra e perdi o segundo combate, mas depois, fruto do grande apoio de todos, concentrei-me, fui às repescagens e cheguei ao bronze”, não esquecendo o bonito e reconfortante gesto do colega e amigo. “Após perder o combate, fui para as bancadas, desanimada. O Stass veio ter comigo, abraçou-me e deu uma força extra, para eu limpar a cabeça e concentrar-me. E resultou”.
A judoca também é presença na Seleção, mas desta vez não foi a Fuengirola, depois de, no ano passado, ter estado na Taça Europa, em Coimbra. “Importa sempre pensar na próxima competição, porque nada acaba hoje e há sempre um amanhã”, sustenta Maria, que elogia o “bom judo que se pratica no Algarve”, num panorama aberto e com outras referências em Faro (Judo Clube do Algarve) e Areias de São João, para além, claro, do emblema de Portimão.
Voltando a Stanislav, a modalidade é uma presença constante na sua vida e o desporto que quer seguir. “Gosto muito de treinar, de estar aqui com esta gente, é um prazer. O que eu mais quero fazer é treinar, combater e ganhar”, garante, sinónimo de uma ambição imensa. Revelando ter “a cabeça no lugar”, mesmo nos momentos complicados, admite algum nervoso antes dos combates, mas quando pisa o tapete não liga a mais nada e fica só “focado em combater e fazer o meu melhor”. Em termos de futuro, prefere ir “passo a passo, com calma”, em vez de traçar grandes objetivos. “Por enquanto, repito, quero é lutar, treinar e ganhar sempre”.
Treinos não interferem nos estudos
Beatriz corrobora a opinião de Maria e opina que o judo no Algarve está ao nível de outros lugares e clubes do país, não obstante o menor número de atletas e, quiçá, de condições um pouco inferiores. “A nossa adaptação é excelente e o resto depende das pessoas e do tipo de treino realizado, com a certeza de que melhorar a condição física é essencial. Veja-se o caso da Rosa Mané, de Faro, que embora júnior já tem cartel e alcança bons resultados nos seniores”.
O judo, acrescente-se, não tira tempo aos campeões do JCP. “Os horários são feitos para não haver preocupações. No meu caso, venho ao final do dia, treino e sigo para casa, nada interfere nos estudos”. Quanto ao futuro, enquanto obtiver posições cimeiras “é para continuar e tentar fazer melhor”, embora sublinhe que se fizer várias provas seguidas sem resultados “qualquer um começa a desmotivar”.
Maria Nobre fala de algumas reservas em termos futuros, uma vez que tem planos para a sua formação. “Quero seguir a carreira militar, vou tentar tirar medicina”, pelo que é prematuro traçar mais metas. Uma coisa é certa: “cada vez há mais mulheres a praticar a modalidade e aquela ideia de que é um desporto para rapazes passou definitivamente à história”.
Na sequência do tema, Stanislav dá conta do “grande respeito” que tem pelos seus colegas e adversários, incluindo os mais velhos, rejeitando qualquer bloqueio mental quando se fala em género ou idades. A hora do treino aproxima-se e o cinturão negro garante que o programa é assim durante todos os dias da semana, sem prejudicar os estudos. Para campeões que se prezam, não há meias palavras…
Beatriz e Manuel Batista medalhados nos juniores
O Judo Clube de Portimão arrecadou mais duas medalhas, através de Beatriz Rosa e Manuel Batista, agora no Nacional de juniores, que decorreu em Albufeira, em 2 e 3 deste mês. O principal destaque vai para a judoca, ainda cadete, com quem o Portimão Jornal estivera à conversa dias antes (ver peça principal), que ganhou a prata em menos de 70 quilos, juntando assim ao título nacional de cadetes o de vice-campeã nacional de juniores. Manuel Batista repetiu o bronze do ano passado, em menos de 81 quilos, sendo de assinalar que veio de propósito de Maastricht, nos Países Baixos, onde estuda, para defender as cores do clube. Também participaram Stanislav Yoltukhovskiy (5º), Gonçalo Duarte, Duarte Silva, Margarida Ramos (7ª) e Maria Zacarias.
Referências e ambiente de excelência
Os nossos judocas têm um olhar criterioso sobre a modalidade e uma resposta pronta quando são desafiados a revelar atletas que os inspirem e sejam referências. Stanislav diz que aprecia muitos, destacando Rosa Mané, “que é incrível”, bem como alguns “franceses de nível com judo bonito”. Porém, desde pequeno que o ucraniano Georgii Zantaraia, campeão mundial, está acima de todos. Beatriz destaca a atual campeã europeia de cadetes, a francesa Nina Muteba, que é da sua categoria e apresenta “técnicas fantásticas”. A opinião de Maria é mais abrangente, aludindo a “vários símbolos do JCP, como Manuel Batista, Stass e a Beatriz”, para além de Uta Abe, a japonesa que é campeã olímpica e mundial. Os três atletas portimonenses salientam ainda os ensinamentos dos professores Joaquim Batista e Delfim Martins, que muito contribuem para a paixão e laços de amizade profundos que caraterizam o clube. “Os judocas de outros clubes também gostam muito de conviver connosco e vamos espalhando as amizades, face a este ambiente de excelência que temos cultivado”.