Vírus

João Reis | Professor


Imagine-se! Como terá sido uma epidemia em tempos antigos – uma epidemia qualquer, em qualquer época – antes de Cristo, na Velha Grécia, ou no majestoso Império Romano ou, mais tarde, na Idade Média, na Europa; e por aí afora. Imagine-se uma pequena aldeia, uma dúzia de famílias, lá longe, no “cu-de-Judas”; em certa altura, começam a aperceber-se que, subitamente, há pessoas muito doentes, sem forças, que empalidecem, que incham, que têm dores e… morrem.

A resposta que ocorre a quem assiste áquilo é dali fugir e procurar refúgio em qualquer outra povoação; se já for infectado, “pega” a outros que contagiarão ainda outros; e começa a epidemia que irá expandir-se tanto quanto as deslocações das gentes.

Terá sido mais ou menos assim, nos surtos que a História nos permite conhecer – da cólera às pestes, da varíola ao ébola, do tifo à febre amarela, o “desbaste” das populações dos 5 continentes foi sempre estimado em muitos milhões.

As causas destes aterradores episódios, originados por bactérias ou vírus, radicaram sempre no encontro de fome, miséria e completa falta de higiene, todas elas “filhas” de graves desequilíbrios económicos e da ignorância.

A História, que nos informa do “antes” das pragas, também nos ensina o “depois”; e, de uma forma geral, a Humanidade foi sempre capaz de responder e corrigir, tendo-se verificado grandes alterações na organização das sociedades. René Dubos, microbiologista e escritor francês, refere que “as epidemias foram, muitas vezes, mais influentes do que estadistas e exércitos a moldar o curso da História”.

Dessas grandes transformações, vale a pena destacar a que se seguiu à peste-negra, no séc. XIV, na Europa, que matou cerca de um terço da população. Tão grande, abrangente e longa, no tempo, veio a ser chamada “RENASCIMENTO” tendo trazido profundas mudanças à sociedade, à política, ao trabalho, à economia, às artes e à cultura, e à ciência, marcando a transição do feudalismo para as primeiras formas do capitalismo.

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Calhou-nos, agora, uma epidemia de tamanho mundial – uma pandemia; advinda de um mal que passa à História sob o nome de “covid-19”. Por ser no tempo das nossas vidas, dói-nos mais! Terá começado num mercado MISERÁVEL, de “clientela duvidosa”, lá bem no oriente, num país misto de RIQUEZA e POBREZA, ATRASO e PROGRESSO, de regime político totalitário. Tomada, no início, como “coisa passageira”, não terá merecido a devida atenção. E o resultado é o que se sabe; e que se vive… Chegado ao ocidente, às cidades grandes, onde as populações mais se concentram, começou a devastação. Nenhum país estava preparado; nenhum serviço nacional de saúde se aguentaria. Fronteiras abertas na Europa, há anos, em paz, voltaram a encerrar-se – não por causa das pessoas que circulavam, mas por causa do vírus que, talvez, carregassem.

De quase todos os Governos, as medidas de protecção foram surgindo; foram ouvidos e entendidos os homens e as mulheres da ciência; Forças Armadas e de Segurança postas em prontidão; os profissionais de saúde, heróica e abnegadamente, avançaram. Os povos dos diferentes países, de uma forma geral, perceberam e aceitaram os convites e os conselhos de isolamento e clausura voluntária; e, toda a gente começou a REDESCOBRIR a amizade, a família, a solidariedade, a generosidade, a força de espírito e, até, o bom humor; voltou o vagar e a capacidade de classificar melhor QUEM e O QUE, de facto, vale e conta MAIS. Declarados os Estados de Emergência e de Calamidade (nomes diferentes para a mesma atitude), novas regras sociais têm vindo a ser introduzidas…

E O MUNDO FECHOU! PARA OBRAS!!!

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A esta crise – de saúde pública – deverá seguir-se outra – a da Economia; sendo, por conceito, a arte ou a ciência que estuda a produção, distribuição e consumo de bens e serviços, tem vindo a dominar, cada vez mais, todas as áreas da nossa vida (qualquer leigo apercebe-se disso), favorecendo o consumismo, ao mesmo tempo que se tem rendido ao mundo da finança – banca, mercados, bolsas, multinacionais – um mundo anónimo, desumano, cruelmente cego – que tem permitido que as duas dúzias de pessoas mais ricas do planeta detenham tantos bens e recursos como cerca de metade da população mais pobre, isto é, quase 4 mil milhões de seres humanos. Ora, os mais pobres destes pobres, nas condições de “vida” que conseguirem ter, podem conduzir ao aparecimento de outros novos agentes infecciosos o que, como se vê agora, NÃO AGRADA A NINGUÉM!

Daí que, as OBRAS a que o MUNDO tem de se submeter (já iniciadas, aliás – porque se começou a pensar…) devam convocar e congregar, não só as ciências, mas também a cultura e as artes, a educação e o trabalho, a religião e a política; também a economia e a finança MAS submissas à POLÍTICA , que deverá ser inteligente, humilde, com espírito de missão, determinação e coragem, capaz de gerir a vontade dos cidadãos na RECONSTRUÇÃO DA SOCIEDADE MUNDIAL.

Será um NOVO RENASCIMENTO!

Longo e demorado, como o primeiro! MAS ESTA OPORTUNIDADE NÃO PODE SER PERDIDA!!! ASSIM SEJA!

“Humanos, tereis de mudar de vida se quereis evitar o fim bastante próximo” escreve o Cientista Catedrático Carlos Fiolhais, no prefácio ao livro “A Terra Inabitável” de David Wallace-Wells, de 2019.

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