Clones de medronheiro rentabilizam negócios

 

TEXTO: VERA MATIAS

Sete mil novos clones de medronheiros foram produzidos este ano na Herdade Corte Velada, no interior do concelho de Lagos, e, na próxima campanha, na primavera de 2019, a expetativa é que esta quantidade duplique. Os números têm vindo a aumentar e, passo a passo, a aposta neste nicho de mercado tem ganho peso entre os produtores.

A investigação é o pilar deste grande projeto, instalado em 271 hectares a norte de Odiáxere, que pretende rentabilizar a produção de medronheiros. As vantagens enumeradas por Ricardo Pereira, diretor da Corte Velada Investigação, são muitas e apelam à aposta nesta vertente de clonagem que gera um super-medronheiro, sem manipulações genéticas.

“Costumamos aconselhar os clientes a optar pela plantação de clones em áreas mais pequenas, em vez do seminal em terrenos maiores, pois há um retorno mais rápido do investimento”, diz. As razões apontadas são simples, até porque este método tem como base a escolha do melhor exemplar possível.

“Se optar por colocar apenas clones, quando a maioria dos frutos estão maduros, é possível efetuar uma apanha contínua, e voltar, mais tarde, quando os restantes estiverem prontos”, elucida Ricardo Pereira. Uma mais-valia que reduz a mão-de-obra, muito pesada para os produtores, pois no caso do seminal, a apanha do fruto é muito inconstante e tem que ser feita em várias passagens.

Apesar de ser uma planta mais cara (vendida pela Corte Velada a cinco euros), quando comparada com a seminal (que ronda um euro no mercado), os clones começam a produção mais jovens e, se forem bem tratados, conseguem uma quantidade de fruto muito mais elevada, triplicando-a até. Isto além da garantia de medronhos de qualidade, o que permite controlar a produção. “Enquanto o seminal começa a frutificar entre cinco a oito anos após a plantação”, os clones introduzidos “em abril do ano passado já têm fruto”, explica o diretor.

Na Herdade há um espécime, com quatro anos, que é um bom exemplar de um super-medronheiro e que convence até os mais indecisos. “Produz fruta grande e em cachos, o que facilita a apanha”, observa André Cardoso, vice-diretor do Corte Velada Investigação.

A verdade é que, “se for bem cuidada, não passar por nenhum ‘stress’ hídrico ou por falta de nutrientes, terá mais produção. A ideia de que preciso de uma planta com poucas exigências é boa, mas se a pessoa conseguir oferecer qualidade, com rega e nutrição, terá sempre mais benefícios. Se calhar em vez de ter dez hectares, tem quatro, e com a limpeza devida das terras, e maior cuidado, aumenta a rentabilidade”, constata o diretor. Por sua vez, em comparação com o seminal, 80 por cento da plantação pode até nem dar fruto capaz.

É o que acontece nalguns dos 180 hectares plantados na herdade logo em 2009. “Alguns nem valem o tempo de deslocação. Foi talvez um erro, mas também ainda não existiam clones naquela data. Agora temos intenção de começar a reflorestar, pelo menos, nas falhas entre medronheiros, com os nossos”, avança.

ENCOMENDAS CRESCEM

Mesmo com pouca publicidade ainda, as encomendas são muitas e chegam todos os dias, de vários pontos do país, sobretudo do Alentejo, mas a Corte Velada tem de ‘jogar’ com as campanhas de clonagem, que decorrem na Primavera, e com a criação de stock, além da sobrevivência das plantas.

Após a seleção dos medronheiros, há o processo de clonagem, com o corte da rama, seguindo-se a verificação da taxa de enraizamento. “Não posso produzir mil plantas e, no final, só sobreviverem dez! Depois tem de ir para o terreno e verificar se aguentam a secura e se desenvolve bem. Tivemos alguns clones que, em 20, não sobreviveram 19 e tivemos outros que, em 10, sobreviveram 10”, compara Ricardo Pereira.

A dificuldade é que, no primeiro ano, os anteriores responsáveis administrativos, produziram clones e venderam-nos sem guardar alguma matéria-prima para podar e renovar o stock. “Quebrámos esse ciclo e mantivemos clones para lhes podermos retirar a rama”, conta.

A intenção destes responsáveis é continuar a seleção constante, para encontrar o topo da qualidade. “Já encontrámos indivíduos de interesse, um tinha um fruto enorme e oval, com quatro centímetros por três, o que é um pouco excecional. Mas há muitas características que temos de apurar para que seja uma boa árvore”, contrapõe André.

A verificação da quantidade de fruto de ano para ano, para que a produção seja estável é outras das preocupações. Para quem compra é um ponto essencial, pois poderá estipular uma média e planear. “Se quiser fazer um contrato de fornecimento da fruta, poderá adequar a oferta à procura”, enumera o diretor.

SEM MANIPULAÇÃO GENÉTICA

E apesar de se mencionar a clonagem, esta não implica manipulação genética. “Aqui, estamos a escolher os melhores e a multiplicá-los. Há tratamentos hormonais a gestão da humidade, mas apenas porque o medronheiro é um arbusto que não enraíza conforme os métodos convencionais. Isto é quase como quando a nossa mãe ia roubar uma poda ao quintal da vizinha e escolhia a planta mais bonita”, metaforiza. Neste caso, trata-se de macro-propagação.

A micro-propagação, que pode ser uma investigação futura a implementar na Corte Velada, envolve laboratórios e frascos com um género de gelatina transparente. “Tencionamos um dia fazer micro-propagação. Já temos protocolos desenvolvidos na Universidade do Algarve, quando estive lá a fazer clonagem, mas ainda não temos o equipamento. É um investimento para o futuro”, adianta o responsável.

Mas mesmo parecendo fácil, há cuidados que têm que ser tidos para o bom desenvolvimento da planta, quando esta é colocada na estufa, que se destaca pelo design e pelo uso do vidro, bem como durante o restante processo de adaptação ao exterior, descreve.

“Na nossa estufa mantemos uma humidade constante, e quando a planta sai para o exterior, tem que estar primeiro numa zona de estufa com sombra. Mesmo assim é um choque muito grande. Já fizemos alterações para reduzir as mortes. No cenário da micro-propagação ainda é pior, pois esta está fechada num frasco e quando é retirada tem que ser colocada primeiro num pequeno contentor e, lentamente ir abrindo para deixar o ar entrar”, explica.

A perspetiva destes investigadores é fazer também o estudo de caracterização do medronhal na Corte Velada e começar a distinguir os espécimes melhores para venda do fruto em fresco ou desidratado, para aplicações em doçaria e compotas, como planta ornamental ou aguardente. “Serão estudos bioquímicos mais sérios e aprofundados. Para já, sabemos que a fruta é saborosa, limpa e bonita e que produz uma aguardente de qualidade”, resume Ricardo Pereira.

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