Opinião: “Ser feliz no trabalho?! Meditar no trabalho?!… Então, como é? Não é para trabalhar?”

Patrícia Araújo, Ph.D.
CEO Metodo Positivo Consultoria; Professora Auxiliar no Grupo Lusófona


Os media invadem as notícias com conceitos aparentemente vanguardistas e, subitamente, imensas empresas mudam os nomes dos departamentos de gestão de pessoas (que, frequentemente ainda tinham designações antiquadas como dep. de pessoal ou dep. de RH). Esta explosão de interesse sobre felicidade no trabalho tem imenso valor e relevância.

Porém, quem trabalha no ramo sabe que há décadas que o bem-estar no trabalho é uma preocupação de líderes, organizações, investigadores e até países (apesar de muitas linhagens investigativas preferirem a terminologia bem-estar sobre a de ‘felicidade’).

Contudo, debates científicos à parte, a investigação nas várias dimensões da Gestão, tem se orientado para uma Gestão ancorada na felicidade, e, mais recentemente, o ensino superior começou a qualificar profissionais com formação específica nestas temáticas (como é o caso, por exemplo, de uma disciplina denominada ‘Felicidade Organizacional’, que eu leciono em Portimão e que já existe em várias universidades portuguesas).

Ademais, a felicidade no trabalho tem sido acompanhada de preocupações com a qualidade da vida mental dos trabalhadores e, entre variadas intervenções baseadas em saúde ocupacional ou outros ramos, as práticas meditativas emergem como uma solução com larga evidência científica, incluindo com estudos realizados em organizações portuguesas.

Porém, os paradoxos subsistem. Se ainda há dias uma reputada Business School portuguesa me contactou para criar um produto formativo único, denominado ‘Mindfulness para Líderes’, ansiosa por dar resposta a tantos pedidos de gestores que necessitam ferramentas para lidar com a pressão e o stress atual, por outro lado, os ‘velhos do restelo’ persistem.

Há algumas semanas, reuni com uma renomeada editora de livros científicos e propus a obra ‘Organizações meditativas’. Este livro conterá as bases para empresas de sucesso que incorporem as práticas meditativas e a felicidade laboral (Como o google, por exemplo!) e fornecerá guidelines, programas práticos e testemunhos de gestores que partilharam as suas experiências. O editor, pessoa com décadas de experiência e de vasta cultura, respondeu… “Ui, mas vamos para o trabalho trabalhar ou meditar?”. E assim, remeti-me ao silêncio intencional, nem sequer alimentando mais debate na reunião e retirei-me.

Pensando que seria caso único, passado algumas semanas, uma universidade recusa uma proposta de uma disciplina inovadora por achar que, ensinar mindfulness e práticas contemplativas em cursos superiores é um “descrédito científico” (apesar dos milhares de artigos científicos internacionais publicados anualmente). Aí estão os nossos clássicos ‘velhos do restelo’.

Trabalhar o foco, treinar o músculo da atenção, saber gerir stress, lidar com sensações do corpo, com os pensamentos e emoções quotidianas, são quase sinónimo da lista de requisitos para qualquer função no mercado laboral atual marcado pelos ‘trabalhadores do conhecimento’ como chamaria Peter Drucker, já em 1959. Procuramos o estado de flow, construto do renomeado Mihaly Csikszentmihalyi. Queremos organizações positivas. E, como escrevi num artigo científico internacional recentemente “Queremos trabalhadores produtivos e felizes. Trabalhar É, EM SI MESMO, um tipo de prática meditativa, pois queremos que o trabalho seja realizado em atenção plena, certo?…logo, porque não damos aos colaboradores treino de atenção plena logo no acolhimento?”. Como humana, como trabalhadora-meditadora e como investigadora neste campo, acredito que esse dia, chegará rapidamente, pois, existem desafios profundos para a retenção de talento e, logo uma segmentaçao de trabalhadores iniciará.

Como nos diz o marketing de recursos humanos, as necessidades dos baby boomers, da geraçao X, dos Millenials e da Geração Z (e a geraçao Alpha, nascidos após 2010, prestes a entrar no mercado laboral) são diferenciadas e a atração e retenção de cada geração é radicalmente distinta. As organizaçoes que se diferenciarem, reterão o melhor talento. E o talento que mais se focar, trabalhar em atenção plena, aumentar a sua produtividade e souber gerir as suas emoções no trabalho, ficará com os melhores empregos.

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