Ainda faz sentido sensibilizar para a reciclagem

A reciclagem entrou no mundo dos portugueses há cerca de duas décadas, mas ainda é necessário reforçar a importância da separação de resíduos na atualidade. Apesar de uma grande evolução, tal como indicam diversos números, há muitos cidadãos que ainda não se deixaram convencer pelos apelos ou que ainda pensam que o ato de separar materiais não serve para nada. Há também aqueles que se deixam levar pelo ‘aborrecimento’ de dividir os resíduos em quatro categorias.

E neste aspeto, as crianças continuam, tal como no passado, a ser o grande trunfo para levar a maioria dos adultos lá de casa a separar os resíduos indiferenciados das embalagens de papel ou cartão, de plástico ou metal e de vidro. Há quem já tenha apanhado a ‘onda’ e faça também a compostagem, a reciclagem de pilhas ou rolhas, mas ainda não é o suficiente para minimizar o impacto da ação humana no ambiente. Depois há os mitos e as críticas ao serviço de recolha de recicláveis…

Num ano em que se assinalam os 25 anos da Algar, a Algarve Vivo visitou o Aterro Sanitário do Barlavento, gerido por esta empresa de valorização e tratamento de resíduos, para perceber quais as falhas e sucessos, mas também para mostrar o enorme trabalho que está por detrás do depósito de um simples saco de lixo em aterro ou da valorização de um mero pacote de leite, através da reciclagem.

Bodas de prata
A Algar fez 25 anos no dia 20 de maio e após um quarto de século, a empresa alcançou resultados positivos que colocam o Algarve acima da média nacional no que diz respeito ao tratamento e valorização dos resíduos. Hoje, conta com duas centrais de triagem de resíduos de embalagens, oito estações de transferência de resíduos, 13 ecocentros, dois aterros sanitários, duas estações de tratamento de águas lixiviantes, três centros eletroprodutores de energia elétrica, três unidades de compostagem de resíduos verdes, uma central de valorização orgânica, uma central de tratamento mecânico, um centro de educação ambiental e um veículo de educação ambiental. Dispõe de mais de 3500 ecopontos na região e uma frota com 64 viaturas de recolha seletiva e transferência de resíduos.

Deposição desce em Portimão
Os últimos dados da deposição de resíduos em aterro são de 2019. Nesse ano, o total global depositado nos dois aterros sanitários (Portimão e Loulé) foi 340 292 toneladas de resíduos, menos dois por cento que em 2018, que contabilizou 346 154 toneladas. Do valor total depositado em 2019, 183 166 foram colocados no aterro de Portimão, que diminui a deposição em 16 por cento em relação a 2018, ao passo que Loulé aumentou 22 por cento, tendo sido depositado um total de 157 126 toneladas.

A Algar tem um dos maiores níveis de contaminação do país
e, na maioria das vezes,
cerca de 40 por cento
dos produtos recolhidos
não ‘prestam’ para a reciclagem ainda que os ecopontos tenham sinalética de deposição seletiva.

No que toca aos recicláveis, o concelho de Portimão, por exemplo, onde está instalada uma das duas Centrais de Triagem de Resíduos de Embalagens, recolheu 7 432 toneladas de embalagens de vidro, plástico e metal e papel e cartão, em 2019, mais 6 por cento do que em 2018, em que recolheu 6 981 toneladas, segundo os últimos indicadores disponíveis.

Investimento sobe
A entrada de privados na Algar, a empresa de tratamento e valorização de resíduos do Algarve, em 2015, não deixou que o investimento na manutenção e na segurança decaísse. Muito pelo contrário. As verbas destinadas à recolha seletiva passaram de 122 mil euros, em 2014, para 1,1 milhões, em 2015, ainda que nos dois anos seguintes os valores tenham voltado a descer (apenas 150 mil euros em 2017), segundo dados da entidade revelados à Algarve Vivo. Com a retoma da economia, em 2018, a empresa gastou 3,1 milhões, e no ano passado, 1,9 milhões. Houve mais investimentos, como é o caso da construção da Estação de Tratamento e Mecânico e Biológico (TMB) que custou 12,5 milhões, sem qualquer financiamento exterior, e que ainda está a ser construída. Além disso, segundo a administração, a Algar comprou viaturas, ecopontos de superfície para instalar em diversos concelhos, sistemas de incêndio e melhorou as instalações das estações de transferência. Adquiriu ainda duas estações de tratamento de lixiviados e dois lava contentores.

O problema é que, mesmo com um orçamento de 20 milhões de euros, há prejuízos a registar. Em 2019, a empresa teve um prejuízo ligeiramente superior a 2,1 milhões de euros. A questão reside no tarifário aprovado pela entidade reguladora, o qual foi reduzido em cerca de quatro euros por tonelada em relação a 2018. De acordo com a Algar a entidade reguladora, quando em 2018 fixou o tarifário de forma vinculativa para o triénio 2019/2021, não teve em conta diversos fatores como a subida dos salários, o aumento do custo de materiais e de combustível. Além disso, e no que diz respeito aos investimentos, a entidade reguladora teve em atenção os custos de referência referentes a 2017 e 2018 pelo que, em algumas situações os mesmos não correspondem à realidade atual.

A Algar considera que o tarifário em cima da mesa é demasiado baixo para fazer face a todas as despesas. Entretanto, já deu conhecimento da sua posição à tutela e à Entidade Reguladora, mas ainda não há uma decisão final. A receita da empresa é conseguida através das vendas de recicláveis, das vendas de energia gerada através do biogás, que representa cerca de 10 a 15 por cento do total, do composto e da deposição em aterro paga pelos municípios. Esta última é a grande fatia, constituindo cerca de 60 por cento do total.

Críticas e queixas
A falta de recolha dos resíduos recicláveis colocados nos ecopontos é uma das principais críticas apontadas à Algar, mas a administração da empresa revela que há várias condicionantes que afetam os serviços. “Uma delas é a falta de mão de obra, ainda que a situação agora esteja mais estável. Nos últimos três anos, a Algar aumentou de 250 para 400 o número de trabalhadores. No entanto, teve de criar incentivos para os manter, sobretudo, os motoristas, pois além de ser difícil recrutá-los, também é difícil mantê-los. Um dos estímulos foi pagar as cartas de condução destes veículos pesados aos auxiliares que já trabalham na Algar, com o compromisso de que estes se mantenham na empresa durante determinado tempo. Neste momento, há 60 equipas de recolha no Algarve, mas é sempre necessário reforçar na altura da época alta”, refere fonte da Administração.

No entanto, o problema não é apenas interno e as falhas não existem apenas por culpa da empresa. Há locais que estão identificados como críticos e que levam às queixas da população. É o caso de zonas onde a afluência turística é grande e onde há mais comércio, como a Praia da Rocha, Carvoeiro ou Ferragudo, explica a mesma fonte. São locais onde não é possível efetuar mais recolhas do que as estipuladas, pois de dia o trânsito é caótico e à noite a recolha provoca demasiado ruído. E quando a janela horária é encontrada, às vezes, ainda não há muitos resíduos recicláveis a recolher, pois em zonas de bares ou restaurantes, estes são colocados muito depois da passagem do camião. “Os contentores ficam cheios até ao dia seguinte e quem vê critica”, resume.

Outras vezes, até é a falta de civismo de quem deposita os resíduos, como é o caso das caixas de cartão que deveriam ser espalmadas e, não sendo, ocupam mais espaço no contentor parecendo que este está cheio. Há também quem se ‘aborreça’ a levantar a tampa e a colocá-la dentro do contentor. Quem chega a seguir não abre para verificar se está cheio ou não e faz igual…

Recolha diferente
A recolha seletiva (resíduos recicláveis) é um serviço diferente da que os municípios fazem, que se refere à recolha dos Resíduos Sólidos Urbanos indiferenciados, ainda que haja muitos cidadãos que não percebam essa diferença. As autarquias ou empresas municipais têm rotas diárias estabelecidas e a capacidade de depósito das viaturas e contentores é maior, porque é algo sólido e compacto. Já o plástico e o cartão podem ficar ‘entalados’ na entrada do ecoponto.

Em locais turísticos, com diversas lojas de comércio, quando uma remessa de novo material chega, as embalagens de plástico e de cartão que acondicionam esse mesmo material são muitas vezes depositadas no ecoponto subterrâneo, sem serem espalmadas, e isso é o suficiente para encher rapidamente um contentor. A empresa até tem um serviço próprio, a Algarlinha, que recolhe os resíduos de embalagens recicláveis a pedido no estabelecimento, gratuitamente, mas ainda não há uma adesão em massa dos comerciantes.

Contaminação gera perdas
Os ecopontos de plástico e metal têm um dos maiores níveis de contaminação do país e, na maioria das vezes, cerca de 40 por cento dos produtos recolhidos pela Algar não ‘prestam’ para a reciclagem, ainda que os ecopontos tenham sinalética de deposição seletiva com os materiais que podem ser depositados em cada contentor. Uma lâmpada ou uma chávena de cerâmica não podem ser colocadas no vidrão, uma vez que no ecoponto só se podem colocar embalagens. Por outro lado, “basta uma pessoa deitar um saco de indiferenciado no vidrão para tudo ficar contaminado”, explica a Administração. O mesmo no caso do cartão, em que uma caixa suja de óleo de pizza não pode ser reciclada.

A verdade é que se os resíduos separados e depositados de forma correta, os custos de recolha e triagem seriam muito inferiores aos atuais. “Se as pessoas reciclassem mais, os municípios poupariam mais, pois só pagam os resíduos indiferenciados que entregam na Algar. Apesar de existir um crescimento da reciclagem e menos deposição em aterro, o aumento teria de ser maior”, explica a Administração. Quanto mais não fosse para prolongar a vida das células do aterro, que em 22 anos já esgotaram três, cada uma com cerca de 600 mil toneladas de resíduos indiferenciados.

Como é feita a separação do plástico na Algar?

Além da triagem pré-feita pelos cidadãos em casa, ainda é necessária, nas centrais de triagem, como a de Portimão, uma nova triagem semi-automática. Isto porque, há mais do que um tipo de plástico, que é separado pela sua densidade. Quando chegam, ao monte, os plásticos são inseridos numa passadeira, que no topo tem LED que detetam e separam o PET (garrafas de águas, de sumo, garrafões), o polietileno de alta densidade (embalagens de gel de banho, champô, iogurtes, detergentes líquidos), os plásticos mistos e os tetrapack (pacotes de leite). São separados e colocados em cubas específicas, mas, por vezes, a máquina não consegue detetar determinado material. Nesse caso, segundo a assistente de comunicação e sensibilização da empresa, os produtos são colocados num contentor, que é depois sujeito a triagem manual. Aliás, ainda antes, no início da passadeira, está um funcionário que abre os sacos colocados nos ecopontos e verifica os resíduos que lá estão dentro. “Se estiver lá um tacho ou uma panela, retira-os logo antes que entrem na passadeira”, explica Maria Barros.

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