“É preciso atenção no controlo das fronteiras para evitar um ataque terrorista em Portugal”

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Administrador do Grupo Pestana no Algarve, Pedro Lopes alerta que “pode acontecer” um atentado perpetrado por terroristas do auto proclamado Estado Islâmico, mas, ressalva, tal “nunca seria o fim” do turismo nesta região do sul do país. Reconhece, porém, como um cenário “muito negativo” uma eventual tragédia dessa natureza. “Temos de estar sempre preparados. Ao nível da segurança nunca podemos facilitar”, avisa. Já a outro nível, diz que há campos de golfe “quase falidos” com o IVA a 23 por cento, critica a Região de Turismo do Algarve ao nível da promoção e indica como melhor trunfo nesta matéria a “’batalha’ da net” em vez de gastar dinheiro em feiras.

Texto: Rui Pires Santos e José Manuel Oliveira

A presença de agentes policiais de Portugal a apoiar forças de segurança internacionais em zonas do Médio Oriente, no combate ao autoproclamado Estado Islâmico, poderá trazer riscos de terrorismo ao nosso país e, em particular, a um destino turístico como o Algarve? Há perigo de retaliação?

Pode acontecer sempre uma situação dessa natureza. Contudo, não podemos ter medo dos outros para deixarmos de fazer aquilo que tem que ser feito. É preciso, acima de tudo, estar atento ao nível do controlo das fronteiras. Temos de estar sempre preparados. Ao nível da segurança nunca podemos facilitar. Não podemos esquecer que os responsáveis pelo autoproclamado Estado Islâmico sonham repor o califado e este já chegou ao norte da Península Ibérica…

Um ataque terrorista seria o fim do turismo algarvio?

O fim nunca seria. Mas seria muito negativo. Uma das principais razões porque o turismo de Verão tem vindo a crescer nos últimos anos no Algarve, na Madeira, bem como no sul de Espanha e nas Ilhas Canárias, nomeadamente com ingleses, alemães e nórdicos, entre outros mercados, deve-se à confusão no mundo islâmico. Até 2008, os turistas optavam por destinos como o Egipto e a Tunísia por serem mais baratos, sem o euro. Para ter sol, praia e um hotel de cinco estrelas podia ser mais barato ir para a Turquia ou para o Egipto, do que passar férias no Algarve ou no sul de Espanha. Hoje, com os problemas de segurança existentes naqueles países, os milhões de turistas que iam para esses destinos preferem em parte vir para esta zona da Europa. Estamos a beneficiar com essa situação, acho eu. Como todos os nossos concorrentes que não passam por esta situação muito difícil.

O Algarve tem sido bem promovido a nível nacional e internacional ou existem lacunas nesse âmbito?

 É uma situação sempre discutível. O dinheiro é pouco.

O presidente da Câmara Municipal de Lagoa, Francisco Martins, em recente entrevista ao ‘site’ da revista Algarve Vivo, comparou a promoção levada a efeito em Lisboa pela Região de Turismo do Algarve a “uma banca de gelados”…

Concordo com ele. Esteve lá e viu. Há coisas que não estão a ser bem feitas.

O que falha e quem é o responsável?

Falhamos todos porque o Algarve somos todos nós. Temos de trabalhar em conjunto. É preciso que os empresários, os autarcas e os outros interventores no sector turístico influenciem a Região de Turismo e a Associação de Turismo do Algarve para gastarem melhor o dinheiro disponível. Por outro lado, é questionável a necessidade de ir a muitas feiras. Nós, Grupo Pestana, já praticamente vamos a muito poucas. Só participamos nas feiras de nichos de mercado. Preferimos investir na Internet. Sendo o dinheiro escasso, é sempre complicado aplicá-lo. E há muitas formas de o fazer. Uma é, por exemplo, estar presente numa feira em Berlim, com um ‘stand’ num recinto que, com outros ‘stands’, só para terem uma ideia, ocupa uma área equivalente a dez campos de futebol. O Algarve, se calhar, tem de lá estar. Contudo, pergunta-se: mas qual é o impacto que isso tem, onde está representado todo o mundo? Só um pavilhão da Índia ocupa uma área equivalente a meio campo de futebol…

Então, como deve ser feita a promoção do Algarve?

Parece-me que seria talvez mais importante apostar em mercados de proximidade e nichos de mercado, como por exemplo participar em feiras na Andaluzia e noutras regiões de Espanha, além de certames em Portugal. Hoje em dia, acho que é na Internet que a maior parte das pessoas pesquisa destinos para passar férias. E os primeiros ‘sites’ que surgem no nosso écran, que estejam bem feitos e que sejam atrativos, serão determinantes para a escolha final do consumidor. É a “batalha” na net que temos que vencer!

É importante a ligação aérea Bragança/Portimão?

É sempre melhor do que não existir. Todos os voos que venham para o Algarve ajudam. Contudo, por exemplo em relação aos nórdicos, se não houver voos de três ou quatro cidades principais daquela zona da Europa diretamente para o Algarve, os turistas desses países não vêm para cá. Nesse sentido, é dinheiro bem gasto apostar em determinada quantia por lugar para companhias aéreas que nos tragam clientes.

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Turistas chineses e indianos “para o Algarve representam zero”

E o turismo russo, que era considerado um bom mercado para o Algarve?

Foi um mercado forte no Algarve. Mas nos últimos dois anos caiu muito, pois os voos diretos deixaram quase de existir devido aos problemas regionais. Contudo, outros mercados, sobretudo o português, o espanhol e o inglês, cresceram o suficiente para compensar a queda do turismo russo, situação que nos ultrapassa. Não é por causa do Algarve que o mercado russo registou uma grande queda. Os problemas ficaram a dever-se, por um lado, às questões primeiro da Crimeia, e depois da Ucrânia, o que levou a União Europeia a colocar entraves à entrada de cidadãos russos no mercado europeu; e, por outro lado, devido ao bloqueio económico ocidental a moeda russa caiu a pique. Como tal, os russos, hoje, para saírem do seu país têm muito mais dificuldades na obtenção dos vistos e têm de gastar mais dinheiro e por isso viajam muito menos para outros países. Enquanto houver guerra na Ucrânia não haverá russos em ‘resorts’ na Europa a passar férias. Quando o conflito acabar, acredito que eles voltem.

O que representa para o Algarve o turismo chinês e indiano, numa altura em que tanto se tem falado da importância económica desses países asiáticos?

Para o Algarve representam zero! Absoluto. Porquê? Por um lado, porque não há voos diretos desses países para o Algarve e, por outro, os chineses não gostam de praia. Alguns, mas poucos, compraram cá casa devido às vantagens dos vistos Gold. Para chegarem ao Algarve, têm de se viajar da China para uma cidade europeia e daí provavelmente para Lisboa e daqui para o Algarve. Ou, então, viajam para uma outra cidade europeia para, depois, virem diretamente para Faro. Isto é, um cidadão de Hong-Kong ou de Pequim demora um dia a chegar ao Algarve. O chinês é um cliente sobretudo de cidade. Não é para fazer turismo no sul de Portugal. O mesmo se passa em relação ao cidadão indiano.

Porque se nota a recuperação do turista português no Algarve?

O português tem muito menos disponibilidade económica para passar férias noutros países. A seguir à entrada da ‘troika’ em Portugal, perdeu muito poder de compra devido a cortes nos salários. E o pouco dinheiro que tinha não o gastava em férias com receio do futuro. Hoje, numa altura em que já sabe com o que conta, a pouco e a pouco está a voltar a passar férias sobretudo no Algarve e noutras regiões do país, onde é mais barato do que, por exemplo, ir para o Brasil, que encareceu bastante.

E a concorrência de Andaluzia, no sul de Espanha?

Para passar férias nessa região de Espanha num hotel da mesma qualidade, qualquer turista paga muito mais em comparação com o Algarve. Já num apartamento numa zona muito densa e mal qualificada não muito longe da praia é capaz de conseguir um preço mais reduzido. Os portugueses já passaram muitas férias em Espanha e também já perceberam que ficam bem mais bem servidos em termos de preços e de qualidade no Algarve do que no outro lado da fronteira. E somos muito mais simpáticos!

Como encara esta época turística no Algarve?

Vai ser melhor do que a do ano passado. Até 2009, o turismo registou uma quebra de cerca de 20 por cento. Desde essa altura até agora tem vindo a recuperar lentamente. Dizer-se que são anos turísticos excelentes, não é correto. Estamos é a aproximarmo-nos da situação anterior, ou seja dos níveis de 2009, mas, atenção, sem contar com a inflação. O Algarve não é a galinha dos ovos de ouro como muitos continuam a pensar. Nos anos de 2014 e 2015, pela primeira vez, além de subir a ocupação turística regista-se também um pouco uma subida ao nível do volume de vendas, o que é positivo, e dos preços, situação que não acontecia há muitos anos.

Quais as repercussões do IVA da restauração a 23 por cento?

Pior é o que se verifica no golfe. Enquanto o IVA da restauração passou de 13 para 23 por cento, no golfe registou-se uma subida de 6 também para 23 por cento.

Com que efeitos?

Em consequência dessa situação, os campos de golfe das pontas do Algarve estão quase falidos e sobrevivem, embora com menos resultados, os que se situam na zona central da região, que são os nossos até à Quinta do Lago. É certo que quem joga golfe em Portugal pertence à classe média/alta. Mas no Algarve mais de 90 por cento são estrangeiros. E mais de 85 por cento são estrangeiros não residentes nesta região, ou seja, turistas puros. Portanto, no fundo são os turistas que jogam golfe. Por isso, acho eu, é injusto aplicar a taxa de IVA de 23 por cento a turistas que vêm ao Algarve na época média/baixa para jogar golfe, dormir em hotéis, alugar automóveis e consumir (e bem) em restaurantes e bares.

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O problema da sazonalidade

O que é necessário no Algarve para não encerrarem unidades hoteleiras na época baixa do turismo

“Falta, por exemplo, uma Disney”, destaca, entre outras lacunas, o gestor Pedro Lopes. E como vice-presidente da AHETA – Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, reconhece que “o problema da falta de união” no sector nesta região “está no nosso ADN, o que demorará muitos anos a mudar”.

O Algarve continua condenado a encerrar unidades hoteleiras durante a época baixa do turismo, ou seja, a partir de outubro e até fevereiro/março?

Acho que sim. E o que vai acontecer a partir do mês de outubro deste ano será igual ao que se verificou em 2014. Fecharão os hotéis que tiverem de encerrar porque o mercado encolhe, ou seja, faltam turistas. De resto, também não há muito para fazer no Algarve durante o Inverno. Para além de jogar golfe e passear por estas belas paisagens.

O que tem de ser feito para não fechar hotéis?

Para não se fecharem hotéis no Algarve teríamos de partir o ano em três partes e não em duas como sucede atualmente. Temos a época alta, de maio/junho até final de setembro, que é o período que corre bem. Se passarem a correr melhor os meses de março, abril, maio e o setembro, Outubro e uma parte de novembro, tal já permitirá que as unidades trabalhem com resultados positivos durante oito ou nove meses. Depois, poderão dar férias ao seu pessoal e proceder a pinturas e obras de manutenção nos outros dois/três meses. Em dezembro e janeiro é sempre muito difícil ter turistas no Algarve. Contudo, para evitar o encerramento de dezenas de hotéis e apartamentos turísticos como tem acontecido nos últimos anos, é necessário ter em funcionamento a sério no Algarve parques temáticos. Existe o Zoomarine, que é um excelente produto localizado na zona da Guia, no concelho de Albufeira, mas fecha no Inverno. No Algarve falta, por exemplo, uma Disney. Por outro lado, o Autódromo Internacional do Algarve, situado no concelho de Portimão, tem permitido o lançamento de alguns modelos de automóveis e motos, normalmente nos meses de outono e inverno. Quando ocorre esse tipo de eventos é fantástico, assim como outros que se realizam no Pavilhão do Arade, no concelho de Lagoa. Ou congressos e incentivos de empresas ou sectores profissionais.

Como vice-presidente da direção da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), qual é o principal apelo que pretende lançar ao sector?

De uma vez por todas, as várias entidades do turismo algarvio têm de trabalhar em conjunto. De quem é a culpa da falta da união? Citando a História, desde que o imperador Júlio Cesar conquistou a Península Ibérica dizia que há um povo lá junto aos Montes Hermínios que não se governa nem se deixa governar. Está tudo dito. O problema da falta de união no turismo algarvio está no nosso ADN, o que demorará muitos anos a mudar.

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